Os “democratas” que andamos a apoiar
Editor / Bruno Carvalho — 17 Julho 2023
O breve texto do jornalista Bruno Carvalho que reproduzimos denuncia a natureza fascista do regime de Zelensky, que o Ocidente insiste em branquear. E revela como as contradições históricas entre a Polónia e a Ucrânia vão sendo abafadas em nome do objectivo maior de manter e prolongar a guerra. O nazi ucraniano Stepan Bandera, tornado herói nacional, é pomo de discórdia. Mas nem por isso o regime polaco — que a UE considerava, antes da guerra, antidemocrático — deixa de estreitar laços com o regime de Zelensky, irmanados na missão que o Ocidente lhes confiou de colocar a Nato nas fronteiras da Rússia.
[ NO ANIVERSÁRIO DO MASSACRE DE VOLÍNIA ]
Bruno Carvalho
O parlamento polaco aprovou, por unanimidade, uma resolução que insta a Ucrânia a reconhecer a responsabilidade pela morte de cerca de 100 mil pessoas na região polaca da Volínia em 1943. Faz agora 80 anos que milícias ucranianas, aliadas das tropas nazis, e lideradas politicamente por Stepan Bandera cometeram este genocídio.
Em 2015, as autoridades ucranianas caracterizaram estas organizações fascistas como “combatentes pela independência” da Ucrânia. Ainda antes, em 2010, o parlamento europeu aprovou uma resolução em que condenava a atribuição do título de herói da Ucrânia a Stepan Bandera, durante a presidência de Viktor Yushchenko, por ter sido colaborador nazi. Nesse mesmo ano, Andriy Parubiy, fundador do Partido Nacional-Social da Ucrânia, que viria a coordenar os voluntários na revolta na Praça Maidan, segundo o Washington Post, pediu a Bruxelas para retirar a posição negativa em relação a Stepan Bandera.
Quando Viktor Yanukovich ganhou as eleições [2010-2014] retirou-lhe o título de herói mas a Ucrânia passou a celebrar o dia de nascimento de Stepan Bandera como feriado nacional a partir de 2019. Nesse mesmo ano, o actual presidente ucraniano [Zelensky]afirmou ao Ukrainska Pravda que Bandera era um herói “para uma certa percentagem de ucranianos”, considerando esse facto “normal”.
Outra das figuras que costuma publicar fotografias com imagens de Stepan Bandera é o líder da Associação dos Ucranianos em Portugal, Pavlo Sadokha.
———
Notas do editor
O jornalista Bruno Carvalho é uma das raras vozes a falar contra a corrente acerca da guerra na Ucrânia. Conhecedor do conflito e do território onde se desenrola, apareceu meia dúzia de vezes na CNN a testemunhar factos que muitas vezes desmentem as versões fabricadas nas chancelarias, nas agências de propaganda ou nas redacções. Não admira que tenha de recorrer ao Facebook, de onde colhemos o texto acima, para divulgar a sua visão dos acontecimentos.
Pelo contrário, na mesma CNN (como na SIC e na RTP), têm assento permanente os mais acérrimos propagandistas da Nato e dos EUA — que não hesitam em deturpar factos, inventar êxitos ucranianos e derrotas russas, exortar ao escalar da guerra, ou cobrir de virtudes o regime de Zelensky. Tudo no propósito de alimentar a ilusão de uma vitória ucraniana que justifique a continuação do esforço de guerra ditado a partir de Washington e replicado por Londres e Bruxelas.
A mais vergonhosa falsificação é apresentar o regime de Kiev como guarda avançada dos “nossos valores” ocidentais, como “a linha da frente” da democracia e das liberdades.
A realidade é o exacto oposto: Zelensky eliminou toda a oposição, manipula o aparelho de justiça, persegue as vozes dissidentes, deu poderes especiais às organizações nazis, elimina sumariamente os suspeitos de simpatia pela Rússia, proíbe qualquer manifestação de cultura russa (desde a língua à igreja ortodoxa), conferiu aos membros do poder, civis e militares, toda a liberdade para fazerem fortuna roubando nos auxílios concedidos pelo Ocidente — dinheiro, armas, medicamentos, ajuda humanitária, tudo tem servido para encher os bolsos da clique dirigente.
Tais factos estão abundantemente documentados, mas são ignorados e mascarados pela comunicação social dominante. Basta atentar nas condições para a prometida entrada da Ucrânia na Nato, enunciadas na recente cimeira de Vilnius, para se perceber que, para lá das questões militares, a Ucrânia é hoje um estado completamente corrompido, com o qual nem mesmo a Nato pode contar se não for previamente passado por uma verdadeira barrela que saneie os direitos democráticos, a justiça, a corrupção, a organização económica.
Num ponto que nos toca mais directamente, é importante também perceber a catadura política do líder da Associação dos Ucranianos em Portugal, Pavlo Sadokha, que ainda há dias (decorria a cimeira da Nato) encabeçou em Lisboa uma pequena concentração de ucranianos para exigir do governo português apoio à entrada da Ucrânia na Nato.
Enquanto gente desta espécie beneficia do direito de manifestação, professores de russo são afastados, como sucedeu em Coimbra este ano, ou associações russas com provas dadas são caluniadas e perseguidas, como sucedeu em Setúbal no ano passado.
Para saber em detalhe as actividades de Sadokha e da Associação dos Ucranianos em Portugal, ver o importante trabalho de investigação publicado pelo site Setenta e Quatro “Quem é Pavlo Sadokha? As ligações à extrema-direita ucraniana”.
Para além do massacre de Volínia, a Organização dos Nacionalistas Ucranianos de Stepan Bandera, é ainda responsável pela execução de 250 mil judeus soviéticos ucranianos, entre 1941 e 1944, em colaboração com os nazis alemães — quase 20% dos judeus ucranianos. Os outros 80% tinham sido evacuados para a Rússia no início da guerra pelas autoridades soviéticas.
Comentários dos leitores
•Julio Antunes 17/7/2023, 19:36
Pobre país, que dá guarida, a gente desta estirpe. Uma. vergonha, que nos desonra, e que coloca os nossos governantes, e outros no mesmo saco , ao dar apoio a fascistas, ao dar dinheiro e outros bens, a mando dos EUA, e da " Nato" que são os responsáveis, por esta guerra. Por isso digo:não há guerra, paz, e que vença, quem já venceu o fascismo hiteleriano, e deu paz ao mundo, durante muitos anos
•leonel l. clérigo 20/7/2023, 12:27
Caro Júlio Antunes
A "trova do tempo que passa" pode sempre trazer-nos, se estivermos atentos, algum saber. Mas julgo que muitos dos nossos erros estão em permitir que se transforme o Passado - com sua "autoridade de coisa que existiu" - numa lengalenga de aldrabices "pós-fabricadas" e feitas para nos impedir entender o que de novo nos está trazendo o Movimento Dialéctico das Contradições.
1 - Há um ponto no seu Comentário que discordo e vou referir porquê, esperando não me alongar: é sobre o que julgo ser o seu entendimento do Fascismo.
Quando uma qualquer questão não se torna clara, os "cinzentos" proliferam e passam a andar por aí à solta ofuscando o entendimento das coisas. Temos hoje disso um exemplo "moderno" no Populismo: ninguém, que eu conheça ou fale, parece vislumbrar o que isso é para além dum "Flatus vocis". Quando se diz que o Sr. Viktor Orbán - primeiro ministro da Hungria - é "Populista" deixando sub-repticiamente subentendido ser "fascista", está isto feito para se meter nas cabeças que o homem é uma espécie de "filho da puta" e não mais que isso. É certo que o objectivo é não se pretender mais que isto, para além de cimentar os "campos" do Bem e do Mal: nós os Bons, eles os Maus. Com esta malandrice, as IDEIAS esfumam-se e deixa-se de entender o que quer que seja.
2 - Caro Júlio Antunes: o Fascismo não é nenhum "bicho de sete cabeças" mas uma Ideologia nascida num tempo "Particular" para resolver problemas Particulares, concretos, do seu Tempo.
Ao caso, o que estava em causa era uma Nova Ordem Mundial, que fosse expressão da passagem da fase Concorrencial à fase Monopolista-Imperialista do Capitalismo. Foi o Capitalismo que gerou as 2 GUERRAS MUNDIAIS e de onde resultou a fase onde vivemos e se tem vindo recentemente a esboroar. O Poder dos USA de que fala , foi o resultado do desfecho das 2 guerras mundiais Imperialistas e onde os Nazi-Fascistas foram a "guarda-avançada" da Alemanha e Itália - depois do falhanço dos "Democratas" de Weimar - para conseguirem um "bom naco" Imperial na "nova repartição" do mundo em marcha.
É esse o segredo escondido do Fascismo. (Será que hoje o "propósito" do Sr. Ventura é reconquistar Olivença? Ou o nosso António Costa reconquistar o Basil com a "grande" Europa na "rectaguarda"?...Valha-nos o Anjo da Guarda...).
3 - Salazar - é preciso que se diga sem branquear - esteve cerca de meio século no Poder para defender o "nosso" Império (não por ter um amor de fã ao Fascismo) e, por isso, a Nação consentiu tão longo "mandato" porque ela própria - lá bem no fundo... - achava "precisar desse Império" - em sua "falsa consciência" - para poder sobreviver como Nação, uma "história da carochinha" que há muito lhe era contada pela velha aristocracia tardo-feudal dos Braganças e da Igreja e aceite depois pelos seus "sucessores" burgueses "liberais" de meia-tigela.
O "cinto apertado" e a "porrada da PIDE", foram dois dos "meios" que Salazar - e as classes que o apoiavam - utilizou, entre outros, para "preparar a Nação" para "o que desse e viesse". E ele acabou por vir, trazendo a guerra dos povos africanos depois da inútil "Para Angola e em força", expressão máxima da visão pacóvia de Salazar.
4 - Hoje, essa "saudosa" visão Imperial ainda anda por aí com "pés de lã", alimentando um "falso imaginário" de uma classe burguesa inapta e subdesenvolvida que não sabe - nem pode!...- solucionar os graves problemas do País. Um nó cego!
E hoje, perante o apodrecimento de cerca de 50 anos de "Europa connosco", segue-se a velha regra de quem não vislumbra regras: "tudo que vem à rede é peixe"... nem que seja uma garrafa de plástico deixada pelo "turista". A balbúrdia económico-social do País abandonado a rentistas e especuladores, já é mais que evidente.