Irão: serviço combinado Trump-Netanyahu
Manuel Raposo — 14 Junho 2025

Uma vez mais, o “direito de defesa” concedido a Israel pelo Ocidente imperialista revela o que é na realidade: o direito ao terror de Estado, ao assassinato selectivo, ao massacre de populações civis, à violação do direito internacional e humanitário e à impunidade diante das instituições internacionais.
Quando concedido a respeito de Gaza, a pretexto dos ataques de 7 de outubro, resultou em 60 mil mortos e centenas de milhares de feridos, levou à destruição física completa de um território habitado por mais de dois milhões de pessoas, permitiu o uso da fome como arma de guerra, conduziu ao genocídio e à limpeza étnica assumidos com todas as letras.
Tal “direito” estendeu-se, com efeitos iguais, ao Líbano e à Síria. Agora, tenta-se justificar esse mesmo “direito” assassino com um suposto “risco existencial” para Israel decorrente do programa nuclear iraniano.
Façamos uma pausa para colocar todas as peças no tabuleiro. O Irão tem declarado repetidamente que o seu programa nuclear se destina exclusivamente a fins pacíficos. Para lá das intenções, o Irão é signatário do Tratado de Não Proliferação de armas nucleares (TNP) e, por esse facto, é inspeccionado regularmente pela Agência Internacional de Energia Atómica, um organismo de ONU. Um acordo firmado em 2015 entre o Irão e mais seis países (EUA, Reino Unido, França, Alemanha, Rússia e China) estabeleceu as regras do nuclear iraniano. Esse acordo foi rasgado unilateralmente pelos EUA (Trump) em 2018 com o pleno aplauso de Israel (Netanyahu) e não foi retomado pela administração Biden. O desenlace dessa decisão norte-americana, de conluio com Israel, vê-se hoje no ataque desencadeado contra o Irão.
Ao contrário, Israel não subscreveu o TNP, possui reconhecidamente armas nucleares e não deixa que esse arsenal clandestino seja inspeccionado. (Denúncias recentes apontam mesmo para a implicação de Israel no assassinato de John Kennedy, precisamente por este pretender vigiar e controlar a capacidade nuclear de Israel.)
Em boa lógica, comprovada pelos factos, é Israel que constitui um risco existencial para os povos de todo o Médio Oriente. Pode dizer-se que, se o Irão hoje tivesse armas nucleares, nada do que agora se vê teria acontecido, nem provavelmente o genocídio de Gaza estaria em curso. E seguramente que as negociações que estavam a decorrer entre norte-americanos e iranianos para renovar o acordo de 2015 não seriam interrompidas por Israel à lei da bala, nem seriam usadas pelos EUA como mera fachada para abrir caminho à acção punitiva de Israel, como agora se vê.
Com tudo isto sabido e consabido, ainda os comentadores e políticos de serviço se desdobram em esforços para ilibar os EUA e Trump da agressão cometida contra o Irão. Mesmo depois de o próprio Trump se ter regozijado com a acção de Netanyahu, afirmando despudoradamente que isso seria uma boa maneira de forçar o Irão a assinar o acordo que (supostamente) estava em negociação.
O serviço combinado de Netanyahu com Trump é evidente. Não apenas quanto a Gaza e a Palestina, mas quanto a todo o Médio Oriente.
Até aos anos de 1970, os EUA tinham o mundo árabe, particularmente o Médio Oriente, controlado por dois agentes seus: Israel a Ocidente e o Irão do Xá a Leste. Pelo meio, mantinham tutela sobre as monarquias da Arábia e do Golfo, corruptas até à medula. A revolução iraniana de 1979 rompeu esta hegemonia. O nacionalismo árabe de raiz popular ganhou alento, dotando-se inclusive de forças armadas. As monarquias reacionárias foram forçadas a ensaiar ambições políticas próprias e tímidas reformas. Israel isolou-se como a única verdadeira testa-de-ponte do imperialismo norte-americano na região – com a desvantagem, hoje, de ver o seu patrono de décadas em fase decadente.
O Irão, aliado da Rússia e da China, é hoje membro destacado dos BRICS e da Organização de Cooperação de Xangai. Os planos políticos e os actos de Israel servem em primeiro lugar os propósitos dos EUA que procuram desesperadamente atacar e dividir as organizações que combatem a sua hegemonia em declínio. O Irão é um dos elos desta cadeia que o imperialismo norte-americano procura romper.
Não são as ambições pessoais de Netanyahu nem os seus problemas com a Justiça – repetidamente apontados como estando na base do extremismo sionista – que explicam os acontecimentos dos últimos dois anos. Ao contrário, são os planos bélicos globais do imperialismo, e o seu desespero diante do crescimento de uma oposição mundial, que se servem dos meios mais bárbaros, dos indivíduos mais desprezíveis e das ambições políticas mais condenáveis para alcançar os seus fins. É esse o fundamento da carta-branca dada a Israel.
A UE, que estava a ensaiar uma mudança de discurso (não de prática) diante do escândalo de Gaza, voltou ao seu diapasão normal: manifestar “preocupação” com os acontecimentos, apelar piamente à contenção “de ambas as partes”, mas reafirmar o pleno apoio a Israel para arrasar o Irão, de novo sob o pretexto esfarrapado do “direito de defesa”.
Esta afinidade com os nazis de Telavive mostra o que valem e o que pensam os políticos de Bruxelas e de Londres e, bem vistas as coisas, o que reservam para os países e para os povos europeus com o seu plano de rearmamento da Europa.
Manifestação em Lisboa, dia 17, 18h, entre a Praça Luís de Camões e a Assembleia da República.
Ver comunicado do MPPM de condenação do ataque de Israel ao Irão.
Comentários dos leitores
•leonel l. clérigo 17/6/2025, 16:03
O NEVOEIRO dos COMENTADORES MILITARES ESPECIALISTAS
Confesso que já algumas vezes tive quase a ir à casa de banho vomitar depois de ouvir certos Comentadores das "nossas" TVs. Mas também é preciso que se diga que só os "Órfãos do Império" têm essa capacidade quando encaram como uma "nobre missão" transformarem as "audiências" em "ceguinhos e estúpidos".
1 - Há muito que o Oriente Médio é um ponto chave na História do nosso mundo e muito do que nós todos somos hoje passou por alí, sobretudo pelas grandes REVOLUÇÕES AGRÁRIAS, pelos EXCEDENTES que criou e pelo COMÉRCIO que desenvolveu para os fazer CIRCULAR. Por isso tenho a convicção - talvez ingénua...- que não são meia-dúzia de Tio PATINHAS - adoradores dum CAPITALISMO em claro APODRECIMENTO - que vão levar todo o milenar esforço CIVILIZACIONAL de REGRESSO às CAVERNAS.
2 - Já hoje se torna claro que a BALBÚRDIA do CAPITALISMO se tornou IRRACIONAL estando mais que esgotada o que não permite já resolver os complexos PROBLEMAS SOCIAIS da nossa SOCIEDADE GLOBAL. Há quantos anos persiste o SUBDESENVOLVIMENTO a par com a minoria "DESENVOLVIDA" do desgastado G7 a querer agora RENASCER para "Salvar o Munso"?
3 - A BALBÚRDIA IRRACIONAL "mercantil" está já bem documentada nas CRISES CÍCLICAS sem fim que se vêm manifestando desde a Grande Crise de 29.
É natural que a nossa JUVENTUDE não se aperceba bem dessas CRISES CÍCLICAS do CAPITALISMO: elas não nascem todos os dias. Mas um "jovem" da minha idade, já é capaz de enumerar um conjunto largo de CRISES que o CAPITALISMO nos vem presenteando "à borla". Vale então então enumerar algumas das maiores delas desde o curto período da RECONSTRUÇÃO da EUROPA - o Período do BEM-ESTAR - depois da GUERRA de 39-45 e que durou um curto tempo até ao MAIO de 68:
- a CRISE do Sistema do Padrão-Ouro de NIXON com origem nos gastos militares crescentes do Império USA e que encontrou uma solução ao "estilo" do Imperador Romano Caracala célebre por misturar ao "Denário de prata" cobre apesar de conservar o mesmo valor facial: um belo truque.
- a CRISE da Dívida Latino-Americana que a subida das "taxas de juro" dos anos 80 a pôs de gatas" e incapaz - de acordo com a moral financeira - de "honrar os seus compromissos".
- a CRISE da Bolha imobiliária e de ações no Japão em 1985 que o afetou seu mercado imobiliário e de ações e que, ao estourar, levou o Japão à estagnação.
- a CRISE dos Mercados ditos Emergentes por volta de 1994 - ou seja, dos SUBDESENVOLVIDOS - com características financeiras levando à fuga dos célebres CAPITAIS em busca de "novas paragens" LUCRATIVAS deixando o 3º Mundo a "ganir". O caso do México é uma bela história que deve fazer as delícias "mercantis" da IL.
- a CRISE Mundial do "subprime" em 2008 e bem conhecida em Portugal como a "CRISE do "aperto do cinto" do PASSOS COELHO. Sendo iniciada nos EUA como uma crise do mercado imobiliário, atingiu o mundo "democrático" num foguete, impondo uma recessão global.
Curiosamente, esta CRISE teve o condão de afetar seriamente o CENTRO do IMPÉRIO USA. E há que notar que uma das características Históricas que têm levado à queda dos diferentes IMPÉRIOS - assim como à sua sustentação - tem sido o SECTOR MILITAR e o empolamento das despesas que provoca: ROMA ocidental caiu por incapacidade de sustentar as despesas impostas com a manutenção da grande fronteira com os "bárbaros".
4 - Julgo que o Presidente TRUMP já se apercebeu do "molho de brócolos" em que está metido o seu IMPÉRIO quando põe inscrito no seu boné "MAGA" (Make America Great Again) e aponta à REINDUSTRIALIZAÇÃO ("contra" o RENTISMO?...)
Não sei se ele leu o "RELATÓRIO das MANUFACTURAS" do seu "Pai Fundador" ALEXANDER HAMILTON mas, tudo me faz acreditar que, pelos menos, ouviu falar das suas TARIFAS. De qualquer maneira é lá que ele pode encontrar uma "BOA DEFESA". Com a salvaguarda de que a HISTÓRIA não se REPETE dado suas "circunstâncias" sempre diferentes.
•leonel l. clérigo 21/6/2025, 13:51
UMA ESTÁTUA ao BURGUÊS que DESENVOLVA PORTUGAL
Ao passar hoje pela "Circular" junto a Telheiras, vi de relanço anunciado num "painel publicitário" uma nova Escola que julguei ser Universitária: a LIBERAL. E fiquei a pensar - com os tempos que correm e a "confusão" instalada anunciadora de "quedas do pedestal" - quem seria o "Descendente da Rainha inglesa VICTÓRIA" que se vai aventurar a fundar agora em Portugal uma ESCOLA com tal nome. É preciso muita fé "científica" no Princípio da "PROCURA EFETIVA".
1 - Como parece acontecer hoje com todo o conjunto da ECONOMIA BURGUESA CAPITALISTA, a ECONOMIA do IMPÉRIO USA entrou em grave CRISE, coisa bem visível até no "boné" do Presidente TRUMP que lá tem escrito MAGA (Make America Great Again) e onde o AGAIN parece revelar muita coisa escondida ainda não esclarecida.
Nesse sentido, a denominada MACROECONOMIA - que serviu razoavelmente o IMPÉRIO na sua fase ascensional - parece também estar ela em grave CRISE de "operacionalidade", sobretudo no manejo dos seus "INSTRUMENTOS de LUXO", como é o caso das taxas de JURO e de CÂMBIO.
2 - Sob a capa do "Grande rigor Matemático" (coitada da Matemática que serviu de "pau para toda a colher" da "NOVA" Finança) os "modelos económicos" serviram a falsificação da REALIDADE SOCIAL existente, como se o MUNDO da ECONOMIA (sem POLÍTICA) fosse o reflexo do MUNDO das "galácticas" longínquas.
A saudosa MARIA da CONCEIÇÃO TAVARES contava que alguém do FED lhe dissera certa vez que têm por lá "dezenas" de MODELOS MATEMÁTICOS mas que NENHUM tinha funcionado. No entanto, continuamos a ver e ouvir, de vez em quando, a sra. LAGARDE a falar de "abstrações" que passam ao largo da realidade existente.
3 - Esta falta de POLÍTICAS CONCRETAS e COERENTES - orientada pelo "modelo Macroeconómico" importado que nos chega dos CENTROS do IMPÉRIO e que impedem os SUBDESENVOLVIDOS de formularem Políticas Públicas adequadas ao DESENVOLVIMENTO das suas MÁQUINAS PRODUTIVAS DESADEQUADAS - não tem solução com o EQUILÍBRIO de CLASSES EXISTENTE a favor do CAPITALISMO. Até porque a lógica do CAPITAL é a do DESENVOLVIMENTO DESIGUAL entre uma MINORIA DESENVOLVIDA e o SUBDESENVOLVIMENTO da MAIORIA RESTANTE. É isso que podemos apreciar olhando qualquer Mapa e a própria "constituição" do Eterno G7.
O período ELEITORAL que agora atravessámos foi disso um Exemplo claro. A ausência de PROGRAMA sempre substituído por uma "Listagem ao jeito reivindicativo Sindical" (aquele Hospital, aquela Estação de Metro, aquela Creche...) e que levou agora a AD à "governação", parece demonstrar que, o nosso PAÍS, ainda está bem longe de ter qualquer IDEIA CLARA de DESENVOLVIMENTO.
E, além do mais, UM PAÍS não é um Sindicato.