Todo o apoio à Intifada dos estudantes!

Urbano de Campos — 13 Maio 2024

Protestos pelo fim do genocídio em Gaza alastram nas faculdades

Enquanto o ministro dos Negócios Estrangeiros português, Paulo Rangel, recusa considerar a mortandade em Gaza como genocídio, estudantes de várias faculdades organizam protestos pelo fim da guerra e contra Israel, seguindo o sinal de partida dado pelos estudantes norte-americanos da Universidade de Columbia. Na faculdade de Psicologia de Lisboa teve lugar um dos primeiros acampamentos, desmantelado pela polícia, com oito estudantes presos, a pedido da direcção da faculdade. Outros protestos verificaram-se no Porto e em Coimbra. Hoje, mais duas faculdades de Lisboa – Belas Artes e  Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova – foram ocupadas pelos estudantes.

Estes protestos dão seguimentos às muitas manifestações e outros actos públicos realizados em todo o país desde há meses, exigindo o fim das operações militares e condenando Israel pelo genocídio que leva a cabo há sete meses. Os organizadores dos protestos estudantis anunciam a intenção de fazer da acção um movimento nacional. São suas exigências o cessar fogo imediato e incondicional, o corte de relações financeiras, diplomáticas e políticas com Israel. A carta aberta dirigida à direcção da FCSH, que publicamos, coloca de forma clara as exigências do movimento.

Os protestos têm-se verificado por todo o mundo, seja na Europa – Paris, Berlim, Amesterdão, Genebra, Dublin, Londres – seja na Índia, na Austrália, no Canadá ou no Médio Oriente. Por regra, as autoridades desmantelam ou proíbem acampamentos e manifestações, ou atacam os manifestantes com cargas policiais, fazendo inúmeros presos. Nos EUA mais de dois mil estudantes foram detidos pela polícia. 

Um dos casos mais gritantes do cinismo das autoridades estatais e universitárias passou-se na Irlanda. A direcção do famoso Trinity College de Dublin, além de chamar a polícia, multou a respectiva União dos Estudantes em 214 mil euros com o pretexto de que os protestos tinham prejudicado as receitas esperadas pela realização de um evento. Além da multa, que põe em causa a viabilidade das actividades da União, os responsáveis pelo protesto foram ameaçados de proibição de exames, de perda de alojamento e mesmo de expulsão. 

Os argumentos do poder para justificar estas investidas contra o direito de manifestação são espúrias: desde “anti-semitismo” (quando os protestos deixam bem claro que a questão é a brutalidade genocida de Israel), até “protecção do direito” dos estudantes a frequentarem as aulas e fazerem exames. A verdadeira razão é clara: contrariar o isolamento de Israel e a sua condenação por parte da opinião pública, evitar que se espalhe a noção de que Israel é um estado fora da lei (como realmente é), defender a aliança das potências ocidentais com Israel, sua arma de guerra no Médio Oriente. Por mais voltas que dêem ao assunto, porém, não será  fácil aos EUA e à Europa escaparem à acusação de que são cúmplices do morticínio que decorre em Gaza à vista do mundo inteiro.

Estes protestos estudantis, que trazem à memória os movimentos contra a guerra do Vietname – ou, no caso português, contra a guerra colonial -, estão a chamar à luta de massas uma nova geração de jovens. A estes há que juntar os muitos que, não sendo estudantes, se empenham na mobilização das populações dos bairros pobres das periferias urbanas onde moram, muitas delas imigrantes – e que se têm igualmente manifestado a respeito não apenas da questão palestiniana mas também das questões sociais que as afectam directamente.

Há condições para que, no curso da acção, esta nova geração vá afinando objetivos e clareza política, contrariando a acusação de “apatia” e “apoliticismo” que muitas vezes lhe é atribuída. Esse é outro dos temores, talvez o mais fundo, que aflige governos e autoridades instaladas, uma vez que a matéria inflamável no domínio social é vasta – emprego, salários, habitação, saúde, meio ambiente… – e uma geração que faça a experiência da luta política ganha conhecimento e coragem para enfrentar todas as dificuldades que se lhe deparem. 

 

CARTA ABERTA À DIRECÇÃO E CONSELHOS DA NOVA-FCSH

Apelamos a todos os membros da comunidade académica e estudantil da NOVA-FCSH que subscrevam esta carta aberta, enviada à Direção e Conselhos da NOVA/FCSH no dia 10 de Maio de 2024. Este formulário deve ser preenchido em nome individual. A lista de assinaturas será atualizada diariamente. Pedimos aos coletivos, núcleos, centros de investigação e departamentos que queiram subscrever a carta e/ou as reivindicações que contactem o EJP-FCSH para o e-mail: ejp.fcsh@gmail.com

Nós, Estudantes por Justiça na Palestina, vimos por este meio expressar a nossa solidariedade com o povo palestiniano e exigir à Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa que quebre o silêncio relativamente ao genocídio em curso em Gaza e ao regime de apartheid que vigora na Cisjordânia e nos territórios da Palestina histórica.

O atual genocídio em Gaza é a expressão derradeira do projeto colonial sionista, responsável pela Nakba de 1948 e pelo processo de limpeza étnica do povo palestiniano sobre o qual se ergue o estado de Israel. Denunciamos o projeto sionista como artefacto do antissemitismo europeu, a que temos o dever de resistir coletivamente, aliando-nos às comunidades e organizações judaicas que, por todo o mundo, recusam a identificação do estado de Israel com um estado judeu.

Se é verdade que Israel ergueu o seu sistema de dominação com o apoio institucional e económico dos governos ocidentais, também é verdade que as suas ações constituem violações sistemáticas da lei internacional que esses mesmos governos sacralizam. Apesar das inúmeras denúncias feitas por organizações internacionais como a Amnistia Internacional e a Human Rights Watch, Israel continua a construir colonatos ilegais, a cometer crimes de guerra e a negar direitos ao povo palestiniano com impunidade.

Enquanto instituição de ensino, construída sobre os valores de Abril, a NOVA-FCSH tem o dever de quebrar o silêncio sobre o massacre que, há sete meses, horroriza a sua comunidade estudantil, e criar espaços de debate honesto e rigoroso sobre o sistema de dominação colonial que oprime o povo palestiniano.

Enquanto estudantes de Ciências Sociais e Humanas, denunciamos os princípios de neutralidade e imparcialidade que movem as políticas institucionais das universidades e tradições de pensamento ocidentais, que escondem o seu enviesamento político e moral.

Trata-se de uma neutralidade falsa. Nas palavras de Desmond Tutu, a quem devemos um legado de resistência contra o regime de apartheid na África do Sul, “ser neutro em situações de injustiça é escolher o lado do opressor”. Reivindicamos uma academia crítica, que recuse a cumplicidade na manutenção de sistemas de opressão, onde quer que eles surjam.

Neste sentido, exigimos à NOVA-FCSH:

Uma tomada de posição pública em solidariedade com o povo da Palestina, em particular com as universidades palestinianas atacadas sistematicamente pelo estado de Israel; 

Uma tomada de posição pública em repúdio do atual genocídio do povo palestiniano às mãos do estado de Israel e a favor de um cessar-fogo imediato e incondicional;

A divulgação e a transparência sobre todos os acordos financeiros e parcerias institucionais entre a FCSH e empresas nacionais e internacionais; 

A interrupção de todos os acordos e parcerias com empresas que lucram com o sistema colonial e o regime de apartheid imposto por Israel na Palestina e estão, por isso, diretamente implicadas no genocídio em curso;

A recusa de qualquer colaboração com instituições de ensino e de investigação israelitas, incluindo acordos de intercâmbio e de cooperação internacional;

O compromisso com a proteção da liberdade de expressão e de direito de protesto da comunidade estudantil e académica;

A constituição de um grupo de trabalho para desenhar acordos de intercâmbio com instituições de ensino superior na Palestina e/ou bolsas de estudo para jovens palestinianos.

O apelo ao boicote económico, cultural e académico pela sociedade civil palestiniana visa diretamente instituições e empresas que contribuem, de forma persistente, para a manutenção do sistema colonial e do regime de apartheid israelita através do seu investimento no aparato militar e governamental sionista, e das suas operações em colonatos ilegais. Trata-se de uma estratégia não-violenta que, recordamos, foi fundamental no isolamento e eventual desmantelamento do regime de apartheid na África do Sul.

Apelamos ainda aos diferentes departamentos e centros de investigação para que, autonomamente, se posicionem publicamente em condenação do genocídio em curso, insiram a Palestina nos seus programas, currículos e atividades, e expressem o seu apoio a este caderno reivindicativo. É fundamental que a academia se afirme como espaço de pensamento crítico e de ação emancipatória, colocando a sua produção teórica à disposição de práticas políticas e sociais concretas.

Nós, Estudantes por Justiça na Palestina, apelamos à Direção e Conselhos da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa que responda às nossas reivindicações e cumpra os seus deveres cívicos e educacionais perante a comunidade estudantil e académica.

Pelo fim do genocídio e por uma Palestina livre.

 

[Assinada por 9 colectivos e núcleos estudantis e por 230 estudantes, mestrandos, doutorandos, investigadores e professores]

 

 


Comentários dos leitores

Hélder Grade 13/5/2024, 21:30

Que não vos falte força porque a Razão vos assiste.A minha inteira solidariedade.


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