NATO em armas para ‘combater o coronavírus’

Manlio Dinucci (*) — 27 Abril 2020

Os 30 ministros dos Negócios Estrangeiros da NATO [no caso de Portugal, Augusto Santos Silva], que se reuniram em 2 de abril por videoconferência, encarregaram o general norte-americano Tod Wolters, Comandante Supremo Aliado na Europa, de “coordenar o apoio militar necessário para combater a crise do coronavírus”. Trata-se do mesmo general que, no Senado dos Estados Unidos em 25 de fevereiro, declarou que “as forças nucleares apoiam todas as operações militares dos EUA na Europa”, o mesmo que se declara “um defensor de uma política flexível de primeiro uso” de armas nucleares, ou seja, ataque nuclear de surpresa (1).

O general Wolters é o comandante supremo da NATO enquanto chefe do Comando Europeu dos Estados Unidos. Faz parte, portanto, da cadeia de comando do Pentágono, que tem prioridade absoluta [sobre outras cadeias de comando] (2). Para “combater a crise do coronavírus”, o general Wolters dispõe de “corredores preferenciais para voos militares através do espaço aéreo europeu”, onde os voos civis quase desapareceram.

Corredores preferenciais também são usados pelos bombardeiros americanos de ataque nuclear B2-Spirit: em 20 de Março, descolaram de Fairford, na Inglaterra, juntamente com caças noruegueses F-16, passando pelo Árctico em direcção ao território russo. Dessa maneira — explica o general Basham, vice-comandante da Força Aérea dos Estados Unidos na Europa — “podemos responder rápida e eficazmente às ameaças na região, demonstrando a nossa determinação em levar o nosso poder de combate a qualquer lugar do mundo”.

Enquanto a NATO se empenha em “combater o coronavírus” na Europa, dois dos principais aliados europeus, França e Grã-Bretanha, enviam os seus navios de guerra para as Caraíbas. O navio de assalto anfíbio Dixmund partiu em 3 de Abril de Toulon para a Guiana Francesa para aquilo que o presidente Macron chama “uma operação militar sem precedentes”, designada “Resiliência”, no âmbito da “guerra ao coronavírus”. O Dixmund pode desempenhar a função secundária de navio hospitalar com 69 camas, 7 dos quais em terapia intensiva.

O papel principal deste grande navio, de 200 m de comprimento e com uma plataforma de voo de 5000 m2, é o do ataque anfíbio: ao aproximar-se da costa inimiga, ataca com dezenas de helicópteros e embarcações de desembarque que transportam tropas e veículos blindados. Características semelhantes, embora em menor escala, têm o navio britânico RFA Argus, que zarpou em 2 de Abril para a Guiana Britânica.

Os dois navios europeus vão posicionar-se nas mesmas águas das Caraíbas, perto da Venezuela, onde está a chegar a frota de guerra enviada pelo presidente Trump, oficialmente para travar o tráfico de droga. (3)

Trump acusa o presidente venezuelano Maduro de “aproveitar a crise do coronavírus para aumentar o narcotráfico com o qual financia seu narco-Estado”. O propósito desta operação, apoiada pela NATO, é apertar o embargo para estrangular economicamente a Venezuela (país que detém as maiores reservas de petróleo do mundo), cuja situação está a agravar-se com a difusão do coronavírus.

O objectivo é depor o presidente Maduro, legalmente eleito — cuja cabeça os EUA puseram a prémio com uma recompensa de 15 milhões de dólares — e estabelecer um governo que arraste o país para a esfera de domínio dos EUA. Não se pode excluir que possa ser provocado um incidente que sirva de pretexto para a invasão da Venezuela. A crise do coronavírus cria condições internacionais favoráveis ​para uma operação desse tipo, apresentada — quem sabe? — como “humanitária”.

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(*) Geógrafo e analista geopolítico. Escreve no jornal italiano Il Manifesto. Artigo publicado em 7.4.2020. Tradução Mudar de Vida.
(1) Ver artigo “O Dr. Strangelove trata da nossa saúde”, Il Manifesto, 24 de Março.
(2) As suas regras rígidas são confirmadas por um episódio recente: o capitão do porta-aviões Roosevelt, Brett Crozier, foi retirado do comando porque, diante da disseminação do coronavírus a bordo, pediu o envio de ajuda, o que foi considerado violação do segredo militar.
(3) Com os mais modernos navios de combate costeiro (também construídos pela empresa italiana Leonardo para a Marinha dos EUA) e milhares de fuzileiros navais.


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