Quem se lembrou de banir a imprensa portuguesa na visita de Netanyahu?

António Louçã — 5 Dezembro 2019

À primeira vista, dir-se-ia que se trata de mais um gesto de prepotência imperial ianque-israelita e mais um agachamento de subserviência portuguesa: Netanyahu e Pompeo pedem um país emprestado para se encontrarem, aterram com as suas próprias comitivas de jornalistas amigos, e proíbem os jornalistas indígenas de estarem presentes. Sem podermos prová-lo, diremos que esta aparência engana. A única explicação com alguma lógica para a imprensa portuguesa ser banida é que a ideia tenha vindo do próprio António Costa.

Senão vejamos: Netanyahu não pôde ir a Londres encontrar-se com Pompeo porque o Governo britânico alegou ridículas e implausíveis “dificuldades logísticas”. A única dificuldade logística deve ter sido Boris Johnson não querer, em caso algum, ser fotografado à porta do N.º 10 de Downing Street a receber um provável futuro presidiário, arguido de muito mais e muito pior do que Ariel Sharon ou Ehud Olmert, um corrupto de gabarito internacional que deixou de ser frequentável em público. E não falemos dos crimes de guerra, porque esses não têm qualquer importância para Boris Johnson.

Como Londres se tornou uma cidade impraticável, Netanyahu e Pompeo olharam então o mapa da Europa e escolheram outra capital — aquela que batesse aos pontos todas as outras em matéria de subserviência. Não era uma questão do governo que, neste momento, estivesse de turno: o que fez Durão Barroso, como mordomo e palafreneiro da cimeira das Lajes, era suposto que Costa o fizesse agora, como anfitrião da escapadela de Lisboa. Um ajudou a preparar a invasão do Iraque, de que ainda hoje o mundo paga a factura, o outro ajuda a preparar a guerra contra o Irão, que sairá ainda mais cara.

E não se pense que o perigo de guerra se torna menor pelo facto de o presidente israelita Reuven Rivlin já andar a negociar com Netanyahu a promessa de imunidade deste em troca da demissão e confissão de culpa. Pelo contrário, o gangster israelita Netanyahu sabe que neste momento o seu lugar no poder está tão comprometido que só a guerra poderia salvá-lo, canalizando as atenções para um inimigo externo.

Nas declarações que prestou em Israel, ao embarcar no avião, Netanyahu deixou claro que, embora tencionasse encontrar-se com António Costa, vinha a Lisboa por outra coisa. Não era novidade, nem era mentira: ele pode ter tido algum breve encontro com Costa, mas essa é uma daquelas chatices protocolares, de ter de dar um coup de chapeau ao tal anfitrião que o albergou quando mais ninguém o queria.

O problema de António Costa e de Augusto Santos Silva é que quiseram ficar bem vistos pelo imperialismo ianque e pelo colonialismo sionista, mas sabem que as fotografias ao lado de Pompeo e de Netanyahu são muito má imprensa. Aos governantes portugueses, mais ainda do que aos visitantes, interessa que a imprensa portuguesa seja mantida a uma distância segura. Ao lado de visitantes destes, qualquer fotografia é hoje comprometedora. Amanhã pode tornar-se fatal.


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