Banif: melhor solução, para quem?

Pedro Goulart — 28 Dezembro 2015

banifSegundo o Tribunal de Contas, “entre 2008 e 2014 foram concedidos apoios públicos ao sector financeiro, cujos fluxos líquidos atingiram no final deste período 11.822 milhões de euros negativos” (6,8% do PIB de 2014). Juntando a este total os mais de 3.000 milhões euros, agora reservados para a “resolução” do Banif, é de prever que, no período posterior a 2008, os gastos do estado português para salvar bancos venham a ultrapassar um montante de 15.000 milhões de euros.

Todos de acordo

O governo PSD/CDS, o Banco de Portugal e a Comissão Europeia (e a troika), em conluio, passaram anos sem resolver o caso Banif.

Em 2012, o governo PSD/CDS injectou 1.100 milhões de euros no Banif. Desses 1.100 milhões, 275 milhões foram liquidados, mas 125 milhões já deveriam ter sido pagos em 2014 e 700 milhões deveriam ser devolvidos até 2017. Sabe-se, entretanto, que a Direcção-geral da Concorrência (da Comissão Europeia) rejeitou oito planos de reestruturação do Banif desde Dezembro de 2012, altura da recapitalização do banco.

Por outro lado, numa carta de 10 de Dezembro de 2014, enviada a Maria Luís Albuquerque, a Comissária Europeia da Concorrência salientava que o problema do Banif tinha vindo a ser adiado “devido à estabilidade financeira” e também “para não colocar em causa a saída de Portugal do Programa de Assistência Económica e Financeira”. Nesta carta, na sequência da reunião em Lisboa entre a comissária Margrethe Vestagen e Maria Luís Albuquerque, fica claro que o último plano de reestruturação do Banif, enviado à Direção-geral da Concorrência em Outubro de 2014, não cumpria os requisitos necessários. Também, em Dezembro do mesmo ano, a Comissária salientava que “uma acção rápida é agora mais premente”.

Aliás, na mesma carta, a comissária explica que a Comissão Europeia só não avançava com uma investigação formal ao Banif, porque o governo português se havia comprometido a apresentar um plano de reestruturação credível até Março de 2015. Mas tal nunca aconteceu. Houve, assim, de facto, uma cumplicidade criminosa entre o governo PSD/CDS, o Banco de Portugal e a Comissão Europeia no arrastar da difícil situação em que se encontrava o Banif.

Quem vai pagar

O governo de António Costa foi rápido a resolver o problema. Mas quem vai pagar os custos?

António Costa afirmou desde o início da “resolução” do processo Banif que estava a acompanhar a evolução dos acontecimentos, garantindo uma “integral protecção dos depositantes”, a confiança no sistema financeiro, as condições de financiamento da economia e a melhor protecção dos contribuintes (embora a estes não desse a garantia de que não iriam ser prejudicados). Uma vez efectuada a “resolução” do Banif, António Costa disse tratar-se da melhor solução, mas cabe perguntar: melhor para quem?

O Banif tinha mais de 350 mil depositantes à data da “resolução”, dos quais 7.411 clientes com depósitos superiores a 100 mil euros (o valor máximo abrangido pela garantia de depósitos), afirmava Mário Centeno na AR. De salientar que o montante médio dos depósitos – por pessoa ou entidade – acima dos 100 mil euros era de 283 mil euros, segundo o ministro.

Esta “resolução”, dando garantias aos mais de 7.411 clientes do banco com depósitos superiores a 100 mil euros, seguiu, com o governo de António Costa, o mesmo padrão verificado nos casos anteriores (BPN e BES, com os governos de Sócrates e Passos Coelho), agradando às classes dominantes (neste caso, em particular às clientelas regionais do PSD e PS), à Comissão Europeia e ao Banco Santander Totta. Veja-se o que sobre isto disseram Passos Coelho, Marcelo Rebelo de Sousa, Alberto João Jardim, Miguel Albuquerque, Vasco Cordeiro e tantos outros homens do regime.

Mas esta “resolução” prejudica gravemente a maioria do povo português, na medida em que será esta a pagar os prejuízos. Enquanto se discutem euros ou cêntimos para salários e pensões, aplicam-se milhares de milhões de euros a salvar bancos. Assim, os clientes do Banif – pessoas e entidades – com depósitos de 300 mil, 500 mil ou 1 milhão de euros aí depositados, serão pagos pelo estado português, isto é, mais uma vez, pelas classes trabalhadoras e pelo povo.


Comentários dos leitores

António Veríssimo 28/12/2015, 14:09

Plenamente de acordo, Pedro.
Abraço

afonsomanuelgonçalves 29/12/2015, 11:44

Não pode ser de outra maneira; debaixo da tutela do Estado concentracionário instalado em Bruxelas a concentração do capital privado continua a sua marcha imparável de acordo com as suas regras inamovíveis. A concorrência, a especulação desenfreada e sem pudor a corrupção legalizada conduz à reorganização da "sustentabilidade" do capital financeiro. Se o capital é trabalho morto como afirmava Marx então há que reproduzi-lo através do trabalho que neste caso corresponde ao saque sem freio da mais valia criada pela venda de trabalho. António Costa ao resolver o problema obedecendo a Bruxelas prestou um bom serviço ao capital e é um justo merecedor da sua confiança.


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