O “flagelo”

22 Julho 2014

Muita boa gente se tem mostrado condoída com a má sorte dos desempregados.
Depois de em 2012 ter dito que o desemprego era “uma oportunidade para mudar de vida”, Passos Coelho veio agora, com dois anos de governação sua em cima, verter lágrimas por um mal “insuportavelmente elevado”. O Papa falou em “flagelo” e na “perda de dignidade humana” em visita a uma região pobre de Itália. E Felipe VI, no seu passeio por Lisboa, proclamou o combate ao desemprego “um desafio ibérico”.

“Flagelo” é a expressão que melhor define o discurso do poder sobre o desemprego: um mal de ressonâncias bíblicas, sem sinal de origem nem remédio humano. A versão terrena do desemprego é outra: em fase de crise dos negócios, os patrões despedem trabalhadores, fecham empresas, retiram capital das funções produtivas, reduzem em cadeia toda a actividade económica.

As lamúrias do poder escondem uma incapacidade: a de dominar o curso da economia e de debelar as crises. Soa a ridículo o dogma de que “são as empresas que criam emprego” (Portas); ou os apelos para que as empresas lancem “iniciativas de combate” ao desemprego (Coelho) — quando justamente o que se vê, dia a dia, é a incapacidade do capital para recuperar da crise em que se afunda há quase sete anos.

A verdade é que não há hoje sinais de crescimento económico que absorva o gigantesco desemprego criado. Mesmo quando, aqui ou ali, há algum crescimento, ele é residual e conseguido principalmente à custa de despedimentos. O capitalismo actual baseia-se em baixos salários, em alta tecnologia e na permanente dispensa de mão de obra. Os seus esforços para “sair da crise” vão todos nesse sentido — reforçando os factores de crise!

É por isto que o combate dos trabalhadores contra o desemprego não pode deixar de ser também um combate contra o sistema social capitalista.


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