Os acontecimentos no Iraque

Tribunal-Iraque — 28 Junho 2014

iraq_Reuters_insurgency_MosA respeito dos acontecimentos das últimas semanas no Iraque, em que um levantamento armado tomou conta de cerca de 70 localidades e vastas regiões do país, o Tribunal-Iraque divulgou a 20 de Junho a declaração que a seguir publicamos, contrariando a informação da generalidade dos órgãos de comunicação que pretendem reduzir os factos a uma ofensiva “terrorista” — coincidindo com a posição dos EUA e do regime iraquiano. Também a Rede Internacional contra a Ocupação do Iraque (IAON) lançou um apelo às organizações de paz e solidariedade para que apoiem o povo iraquiano. Para mais informação consultar os sites Brussellstribunal e Iraqsolidaridad.

“Com base na comunicação social livre e no testemunho de iraquianos vivendo dentro e fora do Iraque, o Tribunal-Iraque divulga as seguintes informações.

1. Os êxitos militares da insurreição e o colapso das forças do governo de Nuri al-Maliki provam que a população iraquiana está farta do regime. O sentimento generalizado é de que “nada pode ser pior do que aquilo que temos”. Sem apoio, o regime chegou a um ponto de ruptura.

2. A luta tem a participação de diferentes organizações e forças políticas. Quer nos combates, quer no governo das cidades libertadas, a acção está a ser coordenada por um Conselho Militar da Revolução formado por antigos militares iraquianos, jovens revolucionários e membros das tribos.
Uma tal conjugação de forças mostra que está em marcha um levantamento geral com amplo apoio da população.

3. A participação no movimento de forças do Partido Baas, das Brigadas da Revolução de 1920, de chefes militares das antigas forças armadas iraquianas, de organizações de resistência islamistas, desmente o papel exclusivo atribuído pelos meios políticos ocidentais a organizações como o ISIL-ISIS (Estado Islâmico do Iraque e Levante ou Estado Islâmico do Iraque e Síria).
Esta distorção dos factos, prontamente repetida pela comunicação social, destina-se a tornar mais fácil neutralizar a opinião pública com a acusação de que se trataria de uma movimentação “terrorista”, e a conseguir assim justificação para uma intervenção militar ou para os bombardeamentos indiscriminados levados a cabo pelo regime instalado em Bagdade.

4. Os alvos da insurreição são claros: o governo e toda a estrutura de poder liderada por al-Maliki, herdeiro do sistema político imposto pela ocupação norte-americana — e, com ele, a dominação exercida pelo imperialismo EUA e a influência de todas as forças externas que se envolveram no conflito iraquiano.

5. A insurreição em curso é de natureza nacionalista e patriótica. O último comunicado do Conselho Militar da Revolução (14 de Junho) especifica os objectivos do levantamento popular:
– Restaurar a justiça e não buscar a vingança. Toda a prestação de contas tem de ser feita de acordo com a lei e através de um processo justo.
– Respeito pelos países vizinhos e pela sua soberania.
– Pôr fim ao sectarismo político e à repressão que foi instalada pela ocupação.
– Iniciar um processo constituinte que represente todos os iraquianos.

6. Testemunhos com origem nas cidades libertadas revelam que a população participa na organização da vida diária. Não há notícias de massacres ou vinganças. Não é significativa a presença de forças não-iraquianas. As barreiras à circulação das pessoas foram removidas. A população que inicialmente fugiu, nomeadamente a de Mossul, regressa agora a casa. O seu maior receio é que o governo de al-Maliki ou os EUA respondam com bombardeamentos, como foi feito em Faluja e Ramadi.

7. Diversas organizações, religiosas e laicas, declararam apoio à revolta e apelam à população e aos combatentes para que mantenham a unidade, rejeitem actos sectários e tratem escrupulosamente a população das cidades libertadas por forma a que “estas cidades se tornem um exemplo para outras que as queiram seguir” (carta aberta da Associação dos Ulemas Muçulmanos no Iraque).

Os acontecimentos dos últimos dias só surpreendem pela natureza fulminante das acções militares dos revoltosos. Mas não espantam se se tiver em conta o que tem sido o sofrimento da população iraquiana nos últimos 10 anos e a resistência que tem oposto à ocupação e ao regime bárbaro que se lhe seguiu. O que agora se passa culmina a resistência armada de 2003-2006, as grandes manifestações de 2011, os protestos generalizados de 2012-13 abafados a tiro pelo regime. E responde às miseráveis condições de vida, aos massacres e arbitrariedades, ao roubo dos recursos nacionais. Nestes 10 anos amadureceram as condições para uma mudança de grande envergadura no Iraque.”


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