Relvas, o indispensável
António Louçã — 10 Março 2014
O pontapé de “Zeca Mendonça” a um repórter fotográfico foi bem o símbolo de um estilo. Não havia dúvida possível: Relvas estava de volta. Com a agressão ao jornalista, o assessor do ex-ministro ilustrou todo um programa político. Era assim o Relvas que tutelou a RTP e era assim o que interveio na linha editorial de jornais que não tutelava (caso de Maria José Oliveira e do “Público”). Os jornalistas, quando saem da linha, devem ser tratados a pontapé.
Tratava-se de um mero resquício do passado? Se assim fosse, Relvas teria entrado no Congresso do PSD pela porta dos fundos e teria ocupado discretamente um lugar no meio da plateia. Mas ele reentrou pela porta grande e Passos Coelho pô-lo logo à frente da lista para o Conselho Nacional.
Dirão as más línguas que Passos Coelho lhe deve muitas atenções e que a inabalável solidariedade entre ambos resulta dos tempos difíceis da Tecnoforma. Falso: em política não há gratidões dessas, e menos ainda quando o pagador de dívidas passadas tem de pagá-las com língua de palmo. Ora, não há dúvida, até a julgar pela votação desastrosa da lista apoiada por Passos Coelho para o Conselho Nacional do PSD, que a ligação a Relvas continua a sair-lhe cara.
O que acontece é que há entre Passos Coelho e Relvas uma afinidade electiva, actualíssima, completamente alicerçada nos imperativos da política presente. Pode Gaspar sair entretanto, pode Portas ameaçar que sai, pode revogar a ameaça, pode sair o Álvaro e entrar o Pires de Lima, pode Poiares Maduro falar doze vezes em consenso – tudo isso são rugas da paisagem, ao lado desse veio estruturante do Governo que é Miguel Relvas. Com o seu regresso à cúpula do aparelho partidário, fica claro que o Governo é fiel a si próprio e, para continuar a obedecer caninamente aos ditames da troika, tem o que é preciso.
Na hora das decisões, o Governo de Passos Coelho não se tornou piegas, não foi assaltado por escrúpulos morais, intelectuais ou culturais, não mudou de estilo, não passou a estudar dossiers e não renegou a arruaça. E tudo isso vai ser preciso para continuar a destruir os fundamentos da vida de um povo. “Zeca Mendonça” é um símbolo e Relvas é um mentor: ambos são o retrato fiel da alma deste Governo.