Justiça para o Iraque, julgamento dos responsáveis pela agressão

Comunicado da Comissão Coordenadora do Tribunal-Iraque — 24 Março 2013

Os dez anos decorridos sobre a invasão do Iraque exigem uma evocação e um balanço.

Desde 20 de Março de 2003, um milhão e meio de iraquianos morreram em consequência da guerra. Cinco milhões de pessoas estão deslocadas no interior ou no exterior do país. Há um milhão de viúvas e cinco milhões de órfãos. Estes números foram divulgados em Fevereiro de 2012 pelo Conselho dos Direitos Humanos da ONU.

Não falando já do embargo que estrangulou o Iraque entre 1991 e 2003, nos últimos dez anos as forças militares dos EUA e dos seus aliados procederam a ataques deliberados contra a população civil, tanto em operações terrestres como aéreas. Fizeram uso de armas proibidas com consequências devastadoras, imediatas e a longo prazo, para as pessoas, os solos, as águas e o meio ambiente. Estes factos são testemunhados por estudos científicos independentes, designadamente os que se debruçaram sobre o caso da cidade de Faluja.

Os ocupantes destruíram toda a organização estatal e social iraquiana. Instauraram um regime político da sua conveniência, inteiramente corrompido, fomentador de divisões sectárias, religiosas ou étnicas. Montaram um sistema prisional baseado em detenções sistemáticas, sem acusação e sem julgamento, na tortura e na pena de morte. Criaram um regime de terror que liquidou centenas de professores, médicos, cientistas, artistas, jornalistas. Uma vez mais, estes factos são confirmados por organizações independentes de direitos humanos.

A retirada oficial das tropas dos EUA, em final de 2011, não libertou o Iraque. O regime político continua sob protecção das forças militares norte-americanas, que mantêm 15 mil tropas no terreno e asseguram a defesa aérea do Iraque, e sob a protecção de milhares de mercenários pagos pelas grandes companhias que exploram os recursos iraquianos.

Desde as primeiras semanas da ocupação, a população iraquiana resistiu como pôde, com e sem armas. Uma guerrilha tenaz, disseminada por todo o território, fez perto de cinco mil mortos e dezenas de milhares de feridos entre as forças ocupantes. Em 2011, acompanhando a onda de sublevações no mundo árabe, e desde o final de 2012, grandes movimentos civis levantaram-se e prosseguem hoje em todo o Iraque. Tais movimentos defendem quer objectivos políticos nacionais, como a unidade do país e a rejeição do sectarismo, quer exigências do dia a dia, como trabalho, condições sanitárias e educacionais, libertação dos presos políticos, justiça.
A resistência é hoje uma movimentação que mobiliza centenas de milhares de pessoas em todo o território iraquiano e que afronta o poder instalado em Bagdade pelos imperialistas norte-americanos e britânicos.

A cumplicidade portuguesa nesta tragédia não pode ser esquecida. Importa lembrar a colaboração de Durão Barroso e de Paulo Portas (então chefe de governo e ministro da Defesa) na agressão. A tolerância de Jorge Sampaio (então presidente da República) perante a decisão da cimeira das Lajes. A colaboração prática na ocupação traduzida no envio de forças da GNR e do agente José Lamego. A gula de empresas portuguesas diante do frutuoso negócio da “reconstrução” subsequente à destruição. O apoio dado aos EUA nos raptos praticados através do chamados voos da CIA.
Importa ainda lembrar que todos os dirigentes políticos do país desde então mantiveram a mesma atitude de subserviência e que esta colaboração os torna cúmplices nos crimes cometidos e amarra o país aos crimes do imperialismo.
Importa sobretudo lembrar que esta política foi levada a cabo contra a vontade manifesta da população portuguesa, largamente contra a agressão e o envolvimento do país na guerra.

Na sequência das posições que tem tomado, o Tribunal-Iraque reitera o reconhecimento do direito do povo iraquiano à plena soberania. Exige a retirada de todas as forças ocupantes e o fim de qualquer tutela estrangeira sobre o Iraque. Defende o pagamento, pelos invasores, de reparações de guerra. Reclama o julgamento dos responsáveis pela invasão e pelos crimes entretanto cometidos.
O Tribunal-Iraque exige das autoridades portuguesas uma mudança completa na política seguida a respeito do Iraque (e prosseguida nos casos das agressões à Líbia e à Síria), desvinculando-se das agressões do imperialismo norte-americano e da União Europeia e procedendo a uma defesa activa da Carta das Nações Unidades e do Direito Internacional.

Comissão Coordenadora do Tribunal-Iraque
19 de Março de 2013


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