As provocações no dia da greve geral

Portugal Uncut / MV — 4 Dezembro 2011

oinfiltrado_72.jpgO blogue Portugal Uncut publicou um relato das agressões e das detenções de que foram alvo alguns manifestantes que participaram no desfile realizado em Lisboa, no dia da greve geral, junto à Assembleia da República. O testemunho, prestado por pessoas que presenciaram os acontecimentos, revelam a presença de agentes policiais provocadores e desmentem as versões oficiais postas a correr pela policia e pelo ministro da Administração Interna. Publicamos a denúncia feita pelo referido blogue.

Não esquecemos, exigimos explicações!

No dia 24 de Novembro último, dia de greve geral e manifestações de apoio a esta última um pouco por todo o país, uma badalada detenção percorreu – a custo – todos os telejornais.
Por volta das 18h, já de noite, enquanto a maioria dos manifestantes se mantinha em frente ao Palácio de S. Bento, algumas pessoas tinham-se afastado e circulavam na Calçada da Estrela. Entre os transeuntes encontrava-se um membro do Portugal Uncut, Nuno Bio, com alguns amigos e ainda a deputada do BE, Ana Drago.
De repente, alguns gritos chamaram a atenção para uma cena de agressões físicas: um grupo de quatro ou cinco pessoas espancava um rapaz, primeiro sem armas e depois utilizando bastões extensíveis. Os amigos deste último e os transeuntes gritavam por socorro e pela polícia. A cena foi filmada por um telemóvel de quem assistiu — imagens entretanto retiradas do Vimeo, mas que se mantêm no Youtube e aparecem em todas as reportagens televisivas sobre o assunto — e ainda pela RTP que, tendo imagens suas não deu a notícia.

À chegada dos agentes fardados da PSP os agressores foram afastados da vítima sem qualquer tentativa de detenção, guardaram novamente os bastões e distanciaram-se, enquanto os agentes fardados detinham a vítima, transportando-a para um carro. Percebeu-se, portanto, que eram agentes à paisana. Este facto foi confirmado quando um deles, tendo ficado ferido (não é claro se pela vítima ou por uma bastonada de um colega), foi transportado para o hospital na mesma ambulância que o repórter da SIC agredido violentamente pela polícia nas escadarias da AR. O agente ferido reportado pela PSP é então este agente à paisana envolvido na agressão da Calçada da Estrela.

Durante várias horas os meios de comunicação foram informados do incidente, receberam o vídeo e fotografias, mas não demonstraram qualquer receptividade a dar notícia do acontecimento. Afinal, o espancamento brutal de um cidadão desarmado por polícia à paisana não tem qualquer interesse editorial. Só no dia seguinte, após muita insistência, a TVI decidiu dar notícia do espancamento com entrevista de testemunhos e um pedido de esclarecimento junto da PSP. Depois da primeira notícia os restantes órgãos de comunicação viram-se obrigados a não ficar atrás.

Entretanto, o Ministro da Administração Interna tinha desvalorizado os acontecimentos e elogiado o comportamento da polícia e a PSP reportava um agente ferido gravemente. A sequência das declarações pode ser vista na reportagem da SIC. Nesta última ficamos ainda a saber por declarações da PSP que o detido era alegadamente um cidadão extremamente perigoso e procurado pela Interpol.

Na sexta-feira, todos os detidos durante a manifestação foram ouvidos em tribunal. O rapaz detido neste episódio fica a aguardar julgamento em Portugal e em liberdade. Não há, afinal, qualquer processo internacional e a sua perigosidade não é tanta que não possa aguardar julgamento em liberdade.

Acusação: agressão de um agente da autoridade e nada que implicasse o anunciado mandato de captura internacional da Interpol. Ficámos assim a saber que a polícia não tem qualquer problema em mentir para a televisão, inventando versões de factos que lhe pareçam favoráveis — mas que, mesmo que provassem ser verdadeiras, nunca explicariam a brutalidade da agressão na detenção de um indivíduo que, como se vê nas imagens, não oferece resistência nem mostra deter quaisquer armas.
Todos os detidos durante a manifestação foram soltos o mais tardar no dia seguinte. Na sexta-feira à tarde já não estava ninguém detido. Nalguns casos as queixas foram retiradas, consideradas improcedentes e noutros aguardam julgamento em liberdade.

Postado por Helena Romão em Portugal UNCUT, 29/11


Comentários dos leitores

A. Poeiras 5/12/2011, 9:29

O mais grave de tudo isto nem é o facto de a polícia infiltrar manifestações e fazer detenções arbitrárias (fê-lo e continuará a fazê-lo, esse é o seu papel), é o facto de lá estarem com conhecimento e a pedido dos sindicatos. Os sindicatos pedirem a infiltração de polícias para controlarem os manifestantes "desordeiros" ou que não obedeçam à voz do dono, isso chama-se, no mínimo, bufaria. Esta prática teve o seu momento alto na manifestação contra a Otan, em que a colaboração entre os PC's e bloquistas e a polícia levou ao isolamento de militantes, inclusive seus, como o Mário Tomé, no interior de um quadrado de polícia de choque. Afinal, vindo de quem vem, também não causa grande espanto...

c a heitor da silva 10/12/2011, 2:15

O importante de tudo isto é darmo-nos conta de que no final a verdade, como o azeite, vem ao de cima e, demonstra à evidência, os métodos fascistas - intentos e inventos de todo o tipo com mentiras à mistura - desta ditadura burguesa / capitalista que designam de democracia, não olha a meios para conseguir os seus fins que são, neste caso, travar o movimento e acção da luta organizada deste martirizado Povo a quem roubam o sustento e mantêm na condição de miséria, enquanto estes indignos governantes se banqueteiam e dispõem duma alcateia de espiões, uns disfarçados outros não tanto, além dos eternos "defensores da ordem", e com a conivência dos falsos dirigentes político/sindicais que vivendo todos à custa de quem trabalha, não se inibem de "morder a mão que lhes dá o pão".... E tudo isto advém do enorme complexo de culpa da burguesia e demonstra o terror que lhes causa uma voz gritando na praça...

c a heitor da silva 10/12/2011, 2:39

É nestas condições que,com sangue, suor e lágrimas, se amassa a consciência de classe e, com base nela, se ganham forças para os combates futuros que se nos apresentam cada vez mais difíceis, se bem que se torna cada vez mais claro que o que temos a perder é, cada vez menos do que temos a ganhar: a liberdade de decidirmos se queremos permanecer escravizados ou morrer de pé como as árvores


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