As grandes fortunas e o seu reverso
Manuel Raposo — 10 Agosto 2011
O despedimento em massa e a quebra dos salários são os aspectos mais destacados do processo de empobrecimento do trabalho. O seu contraponto está no aumento colossal da riqueza de uma pequena parcela de capitalistas que, no decurso da crise, concentram capital e, consequentemente, poder.
Muito para além dos problemas financeiros que o programa da troika teve por alvo (dívida pública e privada, défice das contas do Estado), o capitalismo português debate-se com a sua própria fraqueza. A crise internacional, que leva a concorrência entre capitais a uma disputa de vida ou de morte, torna-o ainda mais vulnerável. Incapaz de crescer (desde 2000 que a economia está praticamente estagnada ou em quebra), limita-se a proceder a uma maciça transferência de riqueza de umas mãos para outras.
É esse o significado dos números revelados nestes dias sobre os aumentos da riqueza dos donos dos maiores grupos económicos. Principalmente assentes em actividades da área financeira (banca, acções) e do sector da circulação de mercadorias (distribuição, comércio), as 25 maiores fortunas nacionais representam mais de 10% do produto interno bruto, e as 3 maiores – detidas por Américo Amorim (grupo Amorim), Soares dos Santos (Pingo Doce) e Belmiro Azevedo (Sonae) – equivalem a mais de 6% do mesmo PIB.
O grupo dos cem capitalistas mais ricos de Portugal, apanhado pela crise iniciada em 2007, teve em dois anos sucessivos uma quebra de riqueza global. As suas fortunas (superiores a 30 mil milhões de euros) representavam, mesmo assim, cerca de 20% da riqueza nacional. Mas em 2010 o incremento dessas mesmas cem fortunas foi superior a 30%, representando hoje uns 25% da riqueza nacional.
Para se perceber melhor o que significa este processo de enriquecimento por via de concentração de capitais, basta atentar na revelação da revista norte-americana Forbes (que se dedica a divulgar as grandes fortunas mundiais) acerca da riqueza de Américo Amorim. Diz a revista que um dos segredos do seu sucesso foi ter criado, com dois irmãos, “um fundo para tirar partido da crise financeira e adquirir empresas em situação de falência”.
Ora, um dos efeitos imediatos desta concentração, assente na liquidação de inúmeros capitais com menor capacidade de competição, é precisamente a eliminação, definitiva, de postos de trabalho. Por isso mesmo, as garantias que os homens do sistema capitalista dão, a cada passo, de que uma futura retoma económica (que, de resto, não se perfila no horizonte) há-de recuperar o emprego – não passam de um processo de vender ilusões.