A única oposição eficaz

Manuel Raposo — 28 Abril 2011

manif12marco1.jpgO ministro Luís Amado, no lugar de Sócrates, disse tudo: para efeitos de futuro governo, as alianças do PS serão com a direita. Nada que não se previsse já, mas fica sublinhado para que não sobrem dúvidas. A afirmação, de resto, vem corresponder às pressões feitas pelos porta-vozes directos do capital desde que a crise dos negócios se agudizou e desde que o receio de convulsões sociais se começou a perfilar.
Começando por defender um acordo governativo, ou “de regime”, entre PS e PSD – o chamado bloco central – as forças do poder económico apostam agora abertamente num bloco de direita que não deixe de fora o PS. É a esta viragem que o PS, através de Luís Amado, vem dizer que sim.

Recordemos que, ainda há poucos meses, os principais banqueiros e homens de negócios fizeram romarias à sedes partidárias do PS e do PSD e desdobraram-se em declarações em apoio do Orçamento de Estado e dos PEC dando isso como fundamental para salvar “o país”. Conseguiram assim, com a disponibilidade incondicional de Sócrates, que mais uns passos fossem dados no sentido de reduzir os apoios sociais aos mais pobres, baixar salários, facilitar despedimentos e o mais que se sabe.

Nova guinada à direita

A actual gritaria dos homens do capital sobre a “incompetência” do governo Sócrates tem, pois, de ser vista como uma barragem de propaganda que visa justificar, aos olhos da população, mais uma guinada política para a direita. O governo do PS sempre aplicou sem qualquer rebuço (tirando as inevitáveis querelas de interesses entre este ou aquele grupo económico) as medidas políticas que o patronato foi exigindo. O que se passa agora é que, com essa política de que o PS foi o fiel executor, amadureceram as condições para subir mais um patamar no ataque aos assalariados.

Ver no PS um travão, mesmo que frouxo, da investida do patronato, ou um factor moderador das medidas anti-sociais que CDS e PSD anunciam, seria inverter por completo o papel por ele desempenhado. Contrariamente à imagem que querem dar de si próprios, o PS e Sócrates – na linha, aliás, do que o PS sempre foi nos momentos críticos! – foram sim os batedores do capital encarregados de desarticular as poucas protecções sociais do Estado, minar as defesas legais do Trabalho e criar, passo a passo, as condições para um governo abertamente de direita.

O espectro da “convulsão social”

Este é o desenlace que está à vista nas actuais condições, seja qual for o vencedor nominal das próximas eleições, haja ou não maioria absoluta de algum dos partidos da direita. E foi em resposta a mais este balanço das classes dominantes para a direita (a que o próprio PS deu toda a colaboração!) que a declaração de Luís Amado veio afirmar : “Estamos nessa”.

Há porém um outro lado da questão. A pressão exercida pelo capital e pelo poder sobre as classes trabalhadoras vai-se tornando cada vez mais insuportável e, do ponto de vista social, faz acumular matéria explosiva. A luta de classes tem condições objectivas para se agudizar. É isso mesmo que vários personagens do capital expressam ao temer “uma convulsão social”, com o espectro de assaltos a supermercados, violência nas ruas, maiores protestos de massas.

Mais do que maioria formal

Para obviar a estes riscos, a burguesia precisa de mais do que uma maioria governativa. Não lhe basta a legitimidade formal de um governo com maioria absoluta no parlamento, porque, para usar uma expressão usada por Adriano Moreira, a fome não está prevista na Constituição. Precisa de forjar uma espécie de “legitimidade social” ao abrigo da qual possa debelar, tanto pela violência policial, como pela propaganda, como ainda pela caridade, os impulsos da população em resposta às medidas terroristas de ataque ao trabalho.

Para isso a burguesia não pode dar-se ao luxo de alienar o PS, de o remeter ao papel de força de oposição e deixar que muitos dos seus apoios populares, sem nada a defender, engrossem as manifestações de rua, passem a gritar “abaixo o governo” e resistam às medidas brutais de “austeridade” que estão a ser negociadas com o FMI/FEEF.

Daí a necessidade, para a burguesia portuguesa, de uma ampla coligação de forças entre PS, PSD e CDS (que não tem necessariamente de assumir a forma de um governo partilhado) com a missão de impedir o engrossar da oposição popular e de desarticular quanto possível a resistência de rua. É a este chamamento, vestido com a capa de “interesse nacional”, que, uma vez mais, a declaração de Luís Amado vem responder com um sim inequívoco.

A única via

A realidade política do lado do poder, depois das eleições de 5 de Junho, não fugirá muito a este quadro. Mas a realidade social pode tornar-se substancialmente diferente do que é agora. A já escassa capacidade de, pela via parlamentar, fazer frente aos ataques do capital será ainda mais diminuída. O que permite reforçar a única oposição eficaz nestas condições: o protesto de rua, a luta de massas.


Comentários dos leitores

António Poeiras 7/5/2011, 18:53

Li há dias, creio que no Correio da Manhã, um texto de opinião do Marques Mendes em que, tentando pressionar no sentido da necessidade de votar no PSD, a criatura argumentava contra a ideia do bloco central ou do governo a três, o que, em sua opinião, seria desastroso. E seria desastroso porque ficaria apenas a esquerda parlamentar (que já tem cerca de 20% dos votos) e, supremo perigo, os descontrolados para capitalizar o descontentamento. É necessário, portanto, que um dos dois partidos fique fora do governo para garantir o controlo da oposição e a vitória em próximas eleições, podendo, assim, tudo continuar a fluir no mesmo sentido.
Elucidativo, até mesmo quanto ao que aí vem!
Mas dei comigo a pensar se não seria por força de um raciocínio semelhante que PC e BE se aproximaram, desatando ao mesmo tempo a afastar mais duramente a concorrência à esquerda, os tais descontrolados que estão disponíveis para soluções diferentes da simples gestão desta coisa ingerível.
Como diria o outro, penso eu de que.


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