Praça Skoda-in-Lisbon

11 Junho 2008

pracadasflores_72dpi.jpgA primeira denúncia sobre o que a seguir se comenta chegou-nos de José Neves (“eleitor e apoiante do Sá Fernandes”) e resume-se assim:
A Câmara Municipal de Lisboa e os seus vereadores Marco Perestrello (vice-presidente, PS) e José Sá Fernandes (Bloco de Esquerda) acharam por bem alugar a Praça das Flores, em Lisboa, a uma marca de automóveis. Durante 17 dias de Junho, no âmbito do seu Convénio Mundial de Vendedores 2008, a Skoda realiza várias festas nocturnas (só para convidados) de lançamento internacional de um novo modelo automóvel, ocupando ininterruptamente o local. Transeuntes, moradores, turistas não têm acesso à praça entre as 17h e a 01h, enquanto decorre a festa privada da Skoda. Uma parte das ruas e todo o jardim estão vedados. Há seguranças privados no jardim e muita polícia. Já houve confrontos entre a polícia e os habitantes, com dois destes a serem levados para a esquadra. As festas sucessivas fazem muito barulho, noite após noite (foi Sá Fernandes que decidiu a “taxa de ruído” cobrada à empresa). O comércio local (excepto os restaurantes e cafés mais finos instalados na praça, abertos apenas para os convidados da Skoda) está a ser prejudicado, segundo os próprios. Mas, mais importante, há um sentimento de revolta pela privatização do espaço público que leva moradores e comerciantes a organizar formas de protesto.

Este novo exemplo de colaboração entre PS e BE, comentamos nós, inscreve-se na visão de que os espaços públicos podem e devem ser cedidos aos negócios privados. Já o mesmo acontecera há pouco tempo – também com a activa anuência do vereador bloquista Sá Fernandes – aquando da cedência do Parque da Belavista a esse grande negócio privado de música anglo-saxónica que é o Rock in Rio, com o falacioso pretexto de que a empresa se comprometia a efectuar obras de interesse público no dito parque. Será esta a política que o Bloco de Esquerda se propõe realizar em todo o país, um dia em que tenha possibilidade de o fazer?

Dividem-se as opiniões de notórios apoiantes do Bloco e de Sá Fernandes. Alguns concordam que o Estado, nomeadamente autarquias como a CML, deixam degradar os espaços públicos e depois entregam-nos a interesses privados com o argumento de arranjar dinheiro para a sua recuperação.
A pretexto da incúria e do desinvestimento do Estado, estabelecem aquilo a que chamam “permutas” ou “parcerias” a troco de verbas ridículas quando comparadas com o lucro proporcionado aos privados. Esta política de liberalização, que liquida as funções sociais do Estado e promove os negócios privados, é, afinal, um prolongamento natural do que acontece na educação, na saúde, nos transportes e estradas, etc. E já está a ser preparado o mesmo com… a distribuição da água!

Mas há outros apoiantes do Bloco – como o colunista Daniel Oliveira no seu blogue O Arrastão – que embarcam nesta visão edulcorada de um neoliberalismo utilitarista a curto prazo, tão bem implementado, por exemplo, no Reino Unido por Thatcher e depois por Tony Blair: “assim vai-se buscar dinheiro aos privados para fazer coisas úteis à população” ou “mais vale assim do que nada”. A falácia que está por detrás deste raciocínio é que o movimento de interesses se dá exactamente ao contrário: são as empresas privadas que vão buscar negócio e lucro ao espaço público, muitas vezes corrompendo processos e pessoas, e não o inverso. O Estado privatizador limita-se a usar noutras coisas o dinheiro público que devia usar no nosso bem-estar.

Esta lógica actual do capitalismo é perversa. E é imparável se não nos opusermos a ela, taco a taco. Ela está já subjacente na argumentação de políticos e gestores em muitos domínios, quando falam em “parcerias” com os privados, em “mecenato”, em “rentabilização de sinergias” e outras expressões correntes na linguagem única que nos é imposta.

O Estado tem sempre dinheiro para aquilo que é vital para a classe dominante: a repressão e a vigilância policial dos movimentos sociais, os espaventos do “prestígio das instituições”, as grandes obras adjudicadas às construtoras para onde transitam os Jorges Coelhos e os Ferreiras do Amaral, as grandes campanhas ideológicas nas televisões e nos outdoors, os subsídios aos grandes agricultores, as benesses fiscais aos grupos económicos portugueses e internacionais, etc.
Para isso há sempre dinheiro do Estado. Para o bem público e para a redistribuição da riqueza criada pelos trabalhadores é que nunca há dinheiro. Eles não estão lá para isso.


Comentários dos leitores

Catarina 24/6/2008, 12:05

Estranho o facto de apenas apresentarem uma foto da praça antes da recuparação feita... pois poderiamos ter uma noção da diferença entre o antes e o depois do evento, da Praça das Flores.
Também estranho o facto de dizerem que os moradores protestavam... pois o que vi foram os moradores em festa durante os 17 dias... os que reclamaram foram precisamente aqueles que moram fora da praça.


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