Ninguém é ilegal!

José Mário Branco — 13 Fevereiro 2008

mineirosbudryk8_72dpi.jpgAs migrações humanas são resultado de necessidades básicas de alimento e abrigo, de fuga à miséria, à subvida, à guerra, às perseguições. Nunca haverá meios repressivos suficientes para deter estes grandes movimentos sociais. Como nos diz Timóteo Macedo, da Solidariedade Imigrante, as autoridades do Estado “insistem no problema das quotas, o que para nós é uma política completamente incorrecta. Porque nós sabemos que é impossível regular os fluxos migratórios.”

Quem precisa de emigrar decide em função do mercado do trabalho. Segundo a experiência de Timóteo Macedo, “as pessoas, sabendo que há trabalho, emigram. Não emigram com o espírito… aqui está-se bem, agora vou para outro país. Não tem nada a ver com isso. O trabalho é um factor decisivo para a pessoa que emigra.”

imigrantes2_72dp.jpgO patronato quer imigrantes em condições precárias
Os imigrantes são uma oferta de braços que se vai equilibrando com a procura de mão-de-obra, como em qualquer mercado. Existe imigração – legal ou ilegal – porque os patrões precisam de mão-de-obra imigrante. É significativo que não se oiçam as organizações patronais falar mal da imigração. E, além de precisarem deles, precisam de os ter indocumentados e fragilizados, para os poderem ter a baixos preços e em condições de trabalho ilegais, precárias e degradadas.
Para José Falcão, do SOS Racismo, “O imigrante serve para tudo: serve para estar aqui sem direitos e ser explorado. Muitas vezes, nos primeiros meses, nem se lhes paga salários, dá-se-lhes 20 euros, 50, para poderem continuar alimentados. Os escravos pelo menos eram alimentados; agora são eles que têm de pagar. Trabalham e quando finalmente conseguem contrato ficam abaixo do salário dos autóctones.”

Um dos exemplos é o da agro-indústria de frutas e legumes da Andaluzia, que assim se tornou nos últimos anos a zona mais rica da Espanha: muitos milhares de trabalhadores (africanos e sul-americanos) escravizados, perseguidos e discriminados, a viverem em contentores e barracas ao lado das estufas onde trabalham, quase sem descanso, por poucos euros. O número dos expulsos ou rechaçados nas fronteiras é uma pequeníssima parte dos que entram; esses casos não impedem a imigração, apenas servem de “exemplo” para manter os imigrantes inseguros e assustados.

imigrantes1_72dpi.jpgUnidade de todos os trabalhadores, imigrantes incluídos
Tem sido essa a verdadeira “política de imigração” dos governos portugueses. E o que os Estados e os patrões fazem com os imigrantes é apenas uma antevisão ou um laboratório do que querem vir a fazer com todos os trabalhadores. Mão-de-obra barata, insegura, dispersa e sem direitos.

Os trabalhadores portugueses têm uma longa e dura experiência de imigração noutros países. As políticas dos sucessivos governos têm levado milhões de portugueses a procurarem trabalho nos países mais ricos. Agora mesmo, é essa a experiência dos 80 mil portugueses que trabalham nas obras em Espanha, dos pescadores que vão para França, dos que vão fazer limpezas em Inglaterra ou na Alemanha. O desemprego português (e a consequente emigração) é uma chantagem do patronato sobre o preço da mão-de-obra em Portugal, uma arma dos patrões para baixar a cabeça e meter medo aos que ainda têm trabalho. Sempre foi assim; é um jogo de forças indispensável ao capitalismo. A única força dos trabalhadores é a sua unidade reivindicativa nas empresas, nos sectores económicos e na produção em geral.

Unidade que tem de ser estendida aos imigrantes, exigindo que todos tenham os mesmos direitos. A existência de imigrantes sem direitos, os limites policiais e administrativos à livre circulação dos trabalhadores entre os países, dos quais resultam a imigração ilegal e as máfias que a exploram, são maneiras de fragilizar a força de trabalho local, porque através dos imigrantes ilegais o patronato pressiona a baixa dos salários dos restantes trabalhadores. Para que isto não suceda há que exigir a legalização dos imigrantes e os seus plenos direitos laborais.

imigrantes4_72dpi.jpgDuas ideias fundamentais
Primeira – Os fluxos migratórios definem-se, no essencial, em função do mercado do trabalho e são fenómenos sociais incontroláveis por via administrativa ou policial. A perseguição ou escravização dos imigrantes, além de criar uma rede de máfias que gerem esses fluxos conforme as necessidades do patronato, serve para assegurar às empresas uma mão-de-obra barata e sem direitos.

Segunda – O tratamento dado pelo Estado e pelos patrões aos imigrantes destina-se a precarizar os trabalhadores locais, fazendo-os aceitar perdas de direitos e baixos salários. O interesse dos trabalhadores portugueses é unirem-se aos trabalhadores imigrantes que os patrões sobre-exploram, exigindo que todos sejam cidadãos com direitos iguais.


Comentários dos leitores

alex 22/2/2008, 17:14

Todo dia oito brasileiros são impedidos de entrar na Espanha
Conforme o chanceler Amorim, do Ministério de Relações Exteriores do Brasil, de 20 a 30 brasileiros tinham sua entrada na Espanha negada por mês. Atualmente, segundo dados do governo, são oito diariamente. Um dos últimos casos foi de uma física brasileira que iria para um congresso em Portugal, mas ficou detida por 53 horas no aeroporto de Madri e depois deportada para o Brasil.


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