EDITORIAL
Fazer pressão
11 Fevereiro 2008
Discursando para as hostes em Alcochete, José Sócrates rejeitou “lições de esquerda” e disse não haver governo que tenha deixado tantas “marcas de esquerda” na política social. Dias depois, substituiu dois ministros com o claro intuito de neutralizar as vozes críticas vindas, precisamente, da “esquerda” situada dentro, e nas imediações, do PS.
Aquilo a que Sócrates chama medidas “sociais” não passam de gestos avulsos destinados a mal compensar o desastre causado pelas medidas de fundo do governo. Não há complemento de reforma ou apoio à natalidade que compensem a queda do nível de vida causada pelo desemprego e pelos baixos salários. Não há leis “civilizacionais” que anulem a degradação das condições de saúde da população provocada pelo desmantelamento dos serviços. Não há ajudas que invertam a quebra do nível de aprendizagem originada pelos cortes orçamentais no ensino.
As medidas que incentivam a exploração do trabalho em condições mais favoráveis para o patronato, em que o governo se tem empenhado acima de tudo, têm incomparavelmente mais efeitos sociais que os paliativos a que Sócrates chama “sociais”. A marca definidora do seu governo é dada por aquelas e não por estes.
A mensagem do primeiro-ministro – para mais na iminência de crise económica mundial – tem uma leitura precisa: do regime não virá nada mais “à esquerda”; contentem-se pois as classes trabalhadoras com o pouco que lhes é dado; e não alimentem esperanças de progresso.
Mas isto indica que a única oposição eficaz é a que se forja fora e contra o regime que Sócrates tão bem corporiza. Mudar de política é, no que interessa aos trabalhadores, despedir este governo por acção de um movimento popular capaz de bloquear a aplicação das suas medidas e impedir que outro igual lhe suceda. Como dizia uma manifestante em frente da Assembleia da República, “não vai haver mudança, a menos que continuemos a fazer pressão”.