Vozes de nós, novo álbum do Cramol

José Mário Branco — 6 Fevereiro 2008

cramol_72dpi.jpgA Ocarina acaba de publicar Vozes de Nós, do Cramol, grupo de cantadeiras fundado em 1979 na Biblioteca Operária de Oeiras. Uma viagem emocionante pelas profundezas do canto rural do povo antigo que vai re-existindo a um século de emigração do campo para a cidade e de revolução tecnológica. 46 temas de todas as regiões de Portugal e alguns das Canárias e País Basco.

Não se pode compreender este país sem ouvir as Cramol. Trinta anos de trabalho para, com um nível de perfeição nada habitual, nos restituir uma chave fundamental do passado. Um testemunho digno do que de melhor se fez neste campo, de Lopes-Graça e Giacometti a José Alberto Sardinha (Grupo Almanaque).

O contacto com as vozes do povo, trabalhador e sofredor, foi fundamental na minha formação como músico e como revolucionário. O facto de esta música, como toda a música, nos atingir sobretudo subjectivamente não a torna menos interveniente. Porque é o povo em todo o seu esplendor, em toda a sua força histórica. Nem guitarras eléctricas nem orquestras conseguem sobrepor-se a este som do fundo dos tempos.

Não menos importante é o trabalho técnico feito com as vozes: colocações e timbres (sobretudo), vibratos aparentemente inexistentes, afinação ligeiramente destemperada das músicas antigas. Trabalho dificílimo feito sucessivamente com três músicos saídos do GAC (Grupo de Acção Cultural): Luis Pedro Faro, Rui Vaz (dos actuais Gaiteiros de Lisboa) e Eduardo Paes Mamede.

Cramol quer dizer “clamor”. Mulheres que, como diz o texto de Domingos Morais, “amam e sofrem sem objecto visível”. Devia ser obrigatório nas escolas. A revolução social de que precisamos também passa por aqui, pela evidência incontornável desta força.


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