Os seguranças
O crescimento acelerado das seguranças privadas é um dos traços distintivos do aparelho repressivo actual
João Bernardo — 25 Dezembro 2007
Em qualquer corredor, à saída de qualquer elevador, junto a qualquer porta, deparamos com eles, bíceps grandiosos, boina à banda e óculos espelhados − os seguranças. O seu crescimento acelerado é um dos traços distintivos do aparelho repressivo actual.
Nos meados da década de 1980 as despesas de segurança privada ascendiam nos Estados Unidos a 22.000 milhões de dólares por ano, enquanto se limitavam a 14.000 milhões de dólares por ano as despesas públicas de policiamento, e as cifras correspondentes eram 90.000 milhões de dólares e 40.000 milhões de dólares nos meados da década de 1990. As cerca de 10.000 empresas de segurança privadas existentes nos Estados Unidos nos meados da década de 1980 ocupavam mais de um milhão de pessoas, aproximadamente o dobro das empregues pelas polícias oficiais; dez anos mais tarde o número de agentes de segurança privados constituía já cerca do triplo do número de polícias, montando a mais de um milhão e meio. Praticamente por todo o mundo passou a haver mais agentes de segurança privados do que membros da polícia. Em 1997, no Canadá e na Austrália os efectivos da segurança privada correspondiam ao dobro dos da polícia oficial, enquanto na Rússia se tinham tornado pelo menos dez vezes superiores. No Reino Unido existiam cerca de 80.000 agentes de segurança privados em 1971, o seu número ultrapassou o dos polícias oficiais nos meados da década de 1980, e em 1997 contavam-se 300.000, o que correspondia a cerca do dobro dos efectivos da polícia oficial.
Estes são os que vemos, mas há ainda os que nos vêem a nós sem que nós os vejamos a eles. As câmaras de vigilância electrónica são hoje um componente tão usual da paisagem urbana que apesar dos letreiros que apelam para sorrir − por que não rir! − já quase não damos por elas. Muitos destes dispositivos, dentro das lojas, por exemplo, são directamente operados por firmas de segurança privadas, mas como em numerosos países, se não mesmo em todos, as polícias oficiais subcontratam uma grande parte da fiscalização electrónica que está a seu cargo, o papel desempenhado pelas firmas privadas torna-se ainda mais considerável.
Além disso, existem países onde as firmas privadas passaram da recolha passiva de informação para a recolha activa, ou seja, dando às coisas os verdadeiros nomes, para a tortura. Depois do escândalo mundial provocado pelos maus tratos que os carcereiros norte-americanos infligiram a muitos presos no Iraque, o governo dos Estados Unidos decidiu subcontratar os interrogatórios, já que as empresas de segurança privadas não obedecem às convenções de Genebra, nem aliás a convenções algumas.
De vez em quando os jornais noticiam que, num ou noutro país, deputados ou representantes de partidos da oposição defendem a criação de órgãos para fiscalizar a actuação da polícia e dos serviços de informação e proteger os cidadãos da curiosidade excessiva das forças de segurança públicas. Pois, pois. E quem nos protege das privadas?
Comentários dos leitores
•murcon 26/12/2007, 20:20
Mas isso é nas ditaduras.Tou a falar bem?
•Paulo Marques 6/1/2008, 3:21
O pior é que não só nas ditaduras. Em qualquer país. Assisti recentemente uma empresa utilizar seguranças privados para surrar trabalhadores grevistas....