Estados Unidos: a fascização da vida quotidiana
À sombra das novas leis anti-terroristas, proliferam os assassinatos políticos, as perseguições, os ficheiros de militantes – e o medo generalizado
M. Gouveia (segundo Naomi Wolf) — 31 Outubro 2007
Depois de publicar o seu último livro, O Fim da América. Carta de Aviso a Um Jovem Patriota, Naomi Wolf, jornalista e escritora, andou a percorrer os EUA e a falar com pessoas de todas as camadas sociais acerca das liberdades, e escreveu um artigo de que se destacam alguns dos aspectos mais significativos.
Dos depoimentos que recolheu: Um director de serviço duma administração tem medo de assinar o papel a autorizar o FBI a ter acesso a todas as informações sobre ele “Mas, se eu não assinar, arrisco-me a perder o meu emprego, a minha casa… é como na Alemanha, quando fizeram o ficheiro de todos os funcionários”. Um importante oficial do exército, que está numa lista de pessoas vigiadas porque criticou a política da administração Bush, mostrou documentos provando que é vigiado pelos serviços secretos bem como toda a sua família. Uma jurista do Ministério da Justiça que se insurgiu contra o “interrogatório reforçado” de um detido, foi chamada a uma comissão disciplinar e submetida a inquérito criminal, não lhe deram a promoção de carreira, o computador foi vasculhado e os mails apagados… Está na lista negra e não pode andar de avião.
Um técnico informático duma companhia aérea explicou-lhe: quando se entra na lista “mesmo que digam que o nome foi retirado, não é verdade. Há um sistema duplicado. Nunca se apaga nada”.
Algumas notícias que leu na imprensa: Foram mortos com balas na cabeça dois dos sete soldados que publicaram uma carta a criticar a guerra; o mesmo aconteceu a uma contabilista do exército que ia denunciar abusos e desfalques; e a Pat Tillman, que escrevera um mail a um amigo em que se dispunha a denunciar crimes de guerra que presenciara. Um empregado do exército que denunciara tráfico de armas nas tropas, no Iraque, foi raptado, preso e torturado numa base militar e oficialmente ameaçado com as piores represálias se falasse no seu regresso ao país. Um sub-contratado do exército que denunciara desvios de dinheiros foi raptado, espancado e expulso do Iraque.
A propósito de o Departamento de Estado – empregador dos mercenários da Blackwater – apoiado pela Casa Branca, se recusar oficialmente a cooperar com o Ministério da Justiça ou com o FBI, no inquérito sobre o assassinato de 17 civis iraquianos inocentes, comenta: “Assim o Estado demonstra que a força para-militar está acima das leis e que a lei já não serve de refúgio para a dissidência”.
E diz: Ao permitir ao FBI e à CIA prender qualquer cidadão e privá-lo dos seus direitos legais, o Secretário da Justiça explicou aos cidadãos que nenhum está ao abrigo das arbitrariedades do Estado. “Podemos aparecer quando e como quisermos, arrombar a vossa porta e fazer-vos desaparecer para sempre… de forma totalmente legal”.
E pergunta: Os membros do Congresso vão ter a coragem de enfrentar a Blackwater quando esta empresa conseguir o contrato da segurança interna dos Estados Unidos? Ou esta força para-militar protegida pelo Estado terá poder suficiente para intimidar os nossos representantes eleitos – e nós próprios? Ousaremos manifestarmo-nos quando soubermos que nos arriscamos aos mesmos maus tratos que os civis do Iraque, metralhados a partir de helicópteros da Blackwater? Haverá algum deputado capaz de propor uma lei contra a Blackwater, sabendo que pode ser liquidado com uma bala na cabeça, com toda a impunidade?
E conclui: “Na situação actual, o Departamento da Segurança da Pátria (‘Homeland Security’) tem o direito legal de, esta noite mesmo, encher a tua cidade de mercenários da Blackwater”.
Comentários dos leitores
•cleria renati diel 21/11/2008, 22:03
Eu gostaria de entrar no exército mas às vezes que é complicado. E parabéns por quem faz este trabalho. Parabéns.