Riscos, perdas e ganhos

8 Setembro 2007

Um empresário não deve ser premiado, pelo seu risco e iniciativa ? Sobretudo se for um trabalhador que, através do seu empreendedorismo, formou uma empresa e colocou lá todo o dinheiro que juntou com o seu trabalho e pode acabar sem nada? 

Empresário, risco, iniciativa, empreendedorismo são termos equívocos. Falemos, mais simplesmente, de alguém que possui um capital (um capitalista, portanto) e o aplica numa operação lucrativa, por exemplo uma empresa. Postas as coisas assim, pouco importa a origem social da pessoa; o mecanismo de valorização que vai pôr em marcha obedece aos mesmos princípios, seja ele filho de burgueses, seja um trabalhador que passa à condição de capitalista.

A única forma de aumentar um capital é pela acumulação de lucro. Como os diferentes capitais são propriedade de capitalistas diferentes, que concorrem entre si, a lógica da valorização do capital é a da obtenção do máximo lucro. O máximo lucro obtém-se pela máxima exploração da força de trabalho, isto é, aumentando quanto possível a diferença entre o valor produzido pelos trabalhadores e aquilo que é despendido pelo capitalista (em salários e outros custos de produção). A exploração não resulta, portanto, de maior ou menor ganância individual, mas da capacidade do capitalista de levar ao extremo a exploração da mão-de-obra. Sejam “bons”, sejam “maus”, todos os patrões obedecem, no cerne da sua actividade enquanto capitalistas, ao mesmo propósito: aumentar sempre a parte de trabalho não pago. É esta realidade que termos como “iniciativa” ou “empreendedorismo” mascaram por referirem mais as particularidades individuais do que a condição de fundo do capitalista.

“Prémio pelo risco”? Quem se decide a uma actividade capitalista é desde logo premiado pela lei absoluta que declara intocável a propriedade privada dos meios de produção. E depois pelas suas decorrências: direito a explorar trabalho assalariado, direito a apropriar-se do produto desse trabalho. É premiado ainda por todos os mecanismos fiscais que permitem às empresas considerarem grande parte dos ganhos como despesas e pagarem menos impostos que os indivíduos isolados, designadamente os trabalhadores assalariados. Etc.

O “risco” que corre um capitalista resulta apenas da competição com outros capitalistas. Se, por qualquer motivo, for fraco, corre o risco de perder para os seus rivais – mas não para os trabalhadores que empregue, porque com esses a sua relação não é de concorrência.
Mas, mesmo numa situação de falência, o capitalista beneficia de enormes protecções legais. Por exemplo, abrir outra empresa com capitais subtraídos à que faliu.
Em contraste, o destino da mão-de-obra de uma empresa falida é o despedimento. E até nisto, uma vez mais, o capitalista beneficia dos mecanismos que levam o Estado a arcar com parte dos encargos com a força de trabalho despedida, concretamente através de subsídios de desemprego. Significa isto que, através do Estado, o capital transfoma em encargo social (pago por toda a sociedade) aquilo que resulta de um prejuizo privado.
No edifício legal e institucional montado para assegurar o funcionamento do capital não faltam, portanto, “prémios” para os “riscos”.


Comentários dos leitores

Francisco d'Oliveira Raposo 26/10/2007, 7:48

Creio que é exatamente por este caminho que se vai caminhando.
A reexplicação do que é obvio para os activistas de 70 e descoberta para os activistas que entram agora na luta.
Por aqui, sim, vale a pena recomeçar de novo


Envie-nos o seu comentário

O seu email não será divulgado. Todos os campos são necessários.

< Voltar