Uma oportunidade perdida na greve geral. É preciso estar à altura do desafio

Filipe Dias — 26 Dezembro 2025

Manifestação 11 dezembro. O pacote laboral não é um detalhe técnico, é um retrocesso com impacto directo na vida de milhões de pessoas

A manifestação da greve geral mal tinha começado a ganhar corpo frente à Assembleia da República e já os discursos das direcções sindicais tinham terminado. Antes de metade dos manifestantes chegar ao local, o ritual discursivo estava concluído. Cumpriram os mínimos, como quem risca uma tarefa da lista. Mas será isso suficiente num momento político tão carregado de implicações para quem trabalha?

Bastaria acompanhar as transmissões televisivas para perceber que o país precisava de mais do que declarações protocolares. Precisava de esclarecimento. Precisava de desmontar, ponto por ponto, a lista de medidas que o governo, em sintonia com os interesses patronais, prepara para impor ao mundo laboral. O chamado “pacote laboral” não é um detalhe técnico: representa um retrocesso civilizacional com impacto directo na vida de milhões de pessoas.

E, no entanto, quando milhares de trabalhadores se juntam num mesmo espaço — muitos deles à procura de respostas, de orientação, de uma narrativa que lhes permita compreender o que está em causa — o que lhes é oferecido? Discursos apressados, esvaziados de conteúdo, incapazes de aproveitar a força simbólica e política do momento.

Se as direcções sindicais tivessem optado por explicar com rigor os diversos aspectos das medidas propostas, teriam tema de sobra para manter o interesse do público até à chegada dos últimos manifestantes. Teriam contribuído para elevar o nível de consciência colectiva, para transformar indignação difusa em acção informada. Teriam, sobretudo, cumprido a função pedagógica que sempre foi central no movimento sindical.

Ao não o fazerem, perderam uma oportunidade preciosa. A luta social não se esgota na presença física; exige clareza, exige discurso, exige mobilização intelectual. Sem isso, corre-se o risco de transformar manifestações em meros rituais — importantes, sim, mas insuficientes para enfrentar reformas que ameaçam direitos fundamentais.

Num momento em que tanto está em jogo, não basta cumprir calendário. É preciso falar, explicar, convencer. É preciso estar à altura do desafio.


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