As “provas”

Manuel Raposo — 2 Abril 2008

Confrontado, no programa da SIC A Quadratura do Círculo de 20 de Março, com a evidência de que as armas de destruição maciça foram uma mentira forjada para atacar o Iraque, Pacheco Pereira ainda procurou uma última escapatória dizendo que “em todo o caso não há provas de que tenha havido manipulação” dos documentos que davam conta da existência das ditas ADM. Quer Pacheco Pereira dizer que, quem, como ele, fez coro com a mentira não tinha razões para descrer das “provas”. Mas este argumento desesperado não resiste à mínima crítica. Que manipulação maior poderá haver que a apresentação de “provas” sobre coisas que não existem? Percebe-se que Pacheco queira no assunto passar por sério ou não ser tomado por idiota útil. Mas deste modo não se safa.

Não é só agora que se sabe que as ADM foram uma invenção: já quando Pacheco enchia páginas de jornais e tempos de antena com demonstrações eloquentes sobre os “perigos” de Saddam Hussein e as “irrefutáveis” provas de Bush, Rumsfeld e Powell, por cujo campo Pacheco optou livremente, já nessa altura inúmeras vozes davam provas – essas sim irrefutáveis e comprovadas – de que tais armas não existiam e de que a administração Bush estava disposta a manipular todos os argumentos para atacar o Iraque. Não só as afirmações feitas desde pelo menos 2002 pelos inspectores da ONU (alguns deles agentes da CIA) davam conta da destruição do arsenal iraquiano. Também o chefe da última leva de inspectores, o sueco Hans Blix, não encontrou no terreno armas nenhumas.

Pacheco Pereira, como todos os Pachecos Pereiras da altura, não quiseram ouvir estas declarações porque preferiram seguir a voz do dono Bush. Tinham escolhido o campo da guerra e portaram-se como seus propagandistas – e para isso tinham de desacreditar todos os argumentos que punham a nu a mentira. Ou seja manipularam eles mesmos, à sua escala, as provas existentes.

Mesmo hoje, continuam a não querer atender às razões, mais que evidentes, que os desmentem. Com efeito, com aquele argumento Pacheco volta, agora numa outra trincheira, a tentar anular as provas patentes de que houve efectivamente manipulação. Por exemplo, o assassinato em Julho de 2003 do cientista inglês David Kelly (ele mesmo antigo inspector da ONU no Iraque) que denunciara à imprensa as falsidades do dossiê sobre o Iraque produzido pelo gabinete de Tony Blair. Ou o abafamento do testemunho do embaixador Joseph Wilson, enviado pela CIA à Nigéria em 2002, que demonstrou serem falsas as acusações dos EUA (apoiados pela secreta italiana) de que o Iraque comprara urânio àquele país africano.

As chamadas “provas” estão hoje sobejamente desmentidas para a grande massa da opinião pública – como já estavam antes do desencadear da guerra para as pessoas informadas, como Pacheco Pereira ou qualquer governante. Os que, mesmo assim defenderam a guerra, esforçam-se agora por parecer sérios. Uns, pacoviamente, dizendo-se enganados, como Durão Barroso; outros, como Pacheco Pereira, afectando uma seriedade intelectual que de facto não tiveram em nenhum momento de todo o desgraçado processo que levou à destruição do Iraque, ao mais de um milhão de mortos, aos 5 milhões de refugiados – a tudo o que por lá se passa e lhes cai irrecusavelmente sobre os ombros na devida quota-parte.

(Texto publicado no site do Tribunal-Iraque www.tribunaliraque.info)


Comentários dos leitores

João Casqueira 12/4/2008, 20:50

Que o Pacheco é pró-americano toda a gente sabe.
Que já se esqueceu daquilo que foi, também toda a gente sabe.
Agora que é cego é que ninguém sabia.
O Pior cego é quele que não quer ver
João


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