Artigo 65, um direito só no papel

Cristina Meneses — 6 Janeiro 2008

semcasamanif_72dpi.jpgDiz a Constituição, no seu Artigo 65.º – Habitação e urbanismo: “1. Todos têm direito, para si e para a sua família, a uma habitação de dimensão adequada, em condições de higiene e conforto e que preserve a intimidade pessoal e a privacidade familiar”.
Para ser efectivo, o Direito à Habitação implicaria a definição de regras de ocupação, uso e transformação dos solos urbanos, e de obrigações por parte do Estado, de acordo com as necessidades da maioria da população. Ao contrário disso, são os interesses da propriedade privada e do capital que prevalecem. O “mercado” coloca em confronto directo o direito de propriedade e a dignidade humana. De acordo com o Censo de 2001, quase um milhão de fogos em Portugal não tinham água canalizada, esgotos, electricidade e instalações sanitárias.

Reportando a 2005, o relatório anual do Observatório Europeu do Racismo e da Xenofobia (EUCM) apontou a habitação como a principal fonte de discriminação dos imigrantes em Portugal. Os estrangeiros são obrigados a viver “em garagens, no local de trabalho ou nos bairros de lata dos grandes centros urbanos”, situação que faz emergir um mercado de arrendamento paralelo.

Plataforma Artigo 65
Organização formada em Março 2006, na sequência de demolições que, nos distritos de Lisboa e Setúbal, deixaram dezenas de pessoas sem casa. Integra um conjunto de associações que tem vindo a exigir dos poderes públicos uma Política Social de Habitação perante uma realidade que exclui milhares de famílias do acesso a uma habitação condigna. Em Outubro 2007, a «Plataforma» entregou na Assembleia da República uma petição, subscrita por mais de 4 mil cidadãos, reclamando que os processos de reabilitação urbana tenham em consideração as necessidades sociais, através da participação das organizações de moradores, da criação de uma regulação pública do mercado imobiliário e da punição efectiva da especulação.

Porta 65 fechada
Os sucessivos governos PS/PSD acabaram com o Incentivo ao Arrendamento Jovem, facultado entre 1992 e 2007, e substituíram-no pelo Programa «Porta 65 Jovem» que afirma ter por objectivo “estimular estilos de vida mais autónomos” entre os jovens e, sobretudo, “dinamizar o mercado da habitação”. Mas o “mercado” não dispõe de oferta que cumpra as condições impostas pelo «Porta 65» que introduz dificuldades de acesso ao incentivo estabelecendo rendas máximas muito abaixo das praticadas no mercado e reduzindo as verbas atribuídas, a duração do apoio e o número de beneficiários. Ao contrário do que é anunciado pelo governo, é possível prever o abandono e a degradação dos centros urbanos; o aumento da precariedade na situação dos jovens, com a diminuição da sua qualidade de vida e um entrave à sua autonomia; e o favorecimento de um relacionamento arrendatário/senhorio compro-metido por falsos contratos de arrendamento abaixo do valor real das rendas.
«Porta 65 fechada» contesta este modelo de incentivo e, em conjunto com a «Plataforma», organizou acções de sensibilização em Lisboa, Porto e Coimbra, a 20 de Dezembro 2007.


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