A Saúde e a caça ao bolo orçamental

Pedro Goulart — 22 Junho 2018

Na Convenção Nacional de Saúde, realizada em Lisboa nos dias 7 e 8 de Junho, Marcelo Rebelo de Sousa advogou que Portugal deve ter uma Lei de Bases de Saúde com princípios claros, mas flexível quanto a orgânicas e estruturas, apostando num “equilíbrio virtuoso” entre público, privado e social. Este “equilíbrio virtuoso” de que fala o presidente da República não anda certamente longe da necessidade de uma “convivência entre os sectores público, privado e social” do PSD e da defesa das Parcerias Público Privadas sustentadas por este partido.

“As metas e os caminhos a definir devem ser, em tese, de longo fôlego – e por isso ultrapassando um governo, uma legislatura, um mandato presidencial”, insistindo aqui Marcelo num acordo com “o maior denominador comum entre partidos e parceiros”. E também Rui Rio parece estar disposto a dar uma mãozinha a Marcelo e aos lóbis e interesses privados que beneficiam com o enfraquecimento do sector Público de Saúde.

Entretanto, um relatório do Observatório dos Sistemas de Saúde recentemente tornado público afirma muito daquilo que já sabíamos: que os cuidados de saúde primários sofrem de grandes carências estruturais e que os hospitais continuam em grave crise, limitados para realizar despesas correntes e de investimento, visto a tesouraria ser determinada centralmente pelo controlo de autorizações do Ministério das Finanças. Ainda, segundo o relatório, nos cuidados continuados integrados, o país está “longe de atingir a cobertura da população” e, também, falta uma aposta nos cuidados domiciliários.

Concomitantemente, o ministro Adalberto Campos Fernandes continua a arrastar-se ao longo do tempo na tentativa de resolução dos enormes problemas com que se debate o SNS, quer quanto às questões laborais, quer quanto aos investimentos necessários e urgentes no sector. Será que Adalberto Campos Fernandes faz tempo enquanto espera o texto de Maria de Belém Roseira, consultora de um grupo privado de saúde, e encarregue por ele de orientar uma equipa para a elaboração de uma Lei de Bases de Saúde? Provavelmente para se juntar a Maria de Belém, a Rui Rio e a Marcelo no “equilíbrio virtuoso” de que fala o Presidente da República, em prol de uma maior pilhagem do OE pelo sector privado da saúde.

Mais uma vez, se as coisas continuarem assim, e pelo que se antevê no debate de uma nova Lei de Bases de Saúde, provavelmente serão os trabalhadores e os mais pobres a pagarem, com as suas carências, o seu sofrimento ou a morte antecipada, as medidas (ou a ausência delas) do governo de António Costa (ou congéneres) no domínio da saúde.


Comentários dos leitores

afonsomanuelgonçalves 24/6/2018, 15:29

Marcelo, independentemente de todos os afectos que espalha pelo país, é e sempre será um social-democrata reciclado após o 25 de Abril. Foram muitos os que se reciclaram apressadamente para continuarem à tona de água. Quando visitou Cuba e se encontrou com Fidel, disse que foi gratificante o encontro mas não revelou aos seus concidadãos os termos da sua conversa com ele. Poderiam ter falado de saúde e com certeza Fidel teria muito a dizer-lhe sobre isso, mas nada transpirou para o conhecimento público. Um truque destes democratas simuladores do diálogo e da transparência.


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