EUA manipulam a “revolução açafrão”

José Mário Branco — 7 Novembro 2007

birmania.jpgDe repente, ecrãs e jornais encheram-se de imagens cor de açafrão, com monges budistas e milhares de populares a contestarem em Rangun, capital da Birmânia, a Junta Militar que domina e reprime 50 milhões de birmaneses há 45 anos. Na internet, proliferam os artigos e os apelos para apoiar “o povo da Birmânia” contra os generais.

Mas uma gaffe da CNN veio alertar-nos: O movimento da “Geração 88”, que lidera a contestação, recebeu contributos do financeiro Soros, do governo norueguês e 2,5 milhões de dólares do NED (National Endowment for Democracy) – organização ligada à CIA que já promoveu outras “revoluções coloridas” na Ucrânia (“laranja”) e na Geórgia (“rosa”).

Os EUA e as potências ocidentais nunca se importaram com o sofrimento do povo birmanês desde que os militares tomaram o poder. Pelo contrário. O regime birmanês é, desde 1994, seu aliado na ASEAN, parceira da NATO na Ásia do Sudeste. Nem a sangrenta repressão das revoltas populares de 1974 e 1988 nem a anulação das eleições que, em 1990, deram vitória esmagadora à oposição democrática arrancaram aos regimes ocidentais qualquer protesto.

Agora que os monges budistas (que defendem, para o país, um regime teocrático) encabeçaram os protestos populares – na sequência de um brutal aumento do custo de vida provocado pelas “reformas estruturais” do FMI – os governos dos EUA e da Europa defendem a imposição de sanções através do Conselho de Segurança da ONU! Certamente semelhantes àquelas que, durante 12 anos no Iraque, pretendendo castigar Saddam, mataram um milhão de inocentes.

Explicação para esta viragem: as boas relações da Birmânia com a China, que lhe equipa o exército, fornece navios à marinha de guerra e constrói estradas e portos. E o acordo petrolífero entre os dois países que, além da exploração de petróleo e gás birmaneses, possibilitou a construção de um oleoduto que liga o golfo de Bengala ao Yunnan chinês e a instalação de uma sofisticada vigilância electrónica nessa rota marítima onde passa 80% do abastecimento de petróleo para a China. E não se pode ingorar, também, o facto de a Birmânia ser o segundo maior produtor mundial de heroína (depois do Afeganistão) e o primeiro de metanfetaminas.

Por isso, devemos reflectir nas palavras do jornalista Thierry Meyssan: “Temos diante dos olhos um povo que luta pela sua liberdade. Mas o apoio que lhe é dado pelos EUA e pelos médias atlantistas não tem, de todo, esse objectivo. Washington quer cortar o oleoduto chinês, desmantelar as bases militares de vigilância electrónica para controlar as rotas marítimas e abrir o mercado às suas multinacionais. Para os birmaneses, não bastará derrubar os generais para serem livres”.


Comentários dos leitores

murcon 8/11/2007, 18:56

É isso mesmo. Infelizmente(?) os media contam todos a mesma história. A verdade a que temos direito...


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