Manuel Serra – a morte de um resistente

Pedro Goulart — 10 Fevereiro 2010

manuelserra.jpgQuando hoje assistimos às sucessivas tentativas de branqueamento do regime derrubado em 25 de Abril de 1974, ao adormecimento cívico de parte significativa dos portugueses e a um clamoroso oportunismo da quase totalidade dos dirigentes partidários, é importante lembrar aqueles que, como Manuel Serra, lutaram duro em defesa de um ideal, não procurando, com essa luta, obter ganhos monetários ou honrarias.

Foi, sobretudo, na Juventude Operária Católica que Manuel Serra tomou consciência da grave situação económica e social das classes trabalhadoras e dos pobres, assim como da total ausência de liberdades, no Portugal de Salazar.

Em 1958, participou na campanha de Delgado à Presidência da República e verificou, na prática, como a ditadura não iria cair através de “eleições”. A repressão era forte e as vigarices do regime eram tantas que eles não sairiam de lá por via pacífica. A Manuel Serra afigurava-se-lhe, então, necessária a intervenção armada como forma de derrubar a ditadura salazarista.

Em 1959, entrou no fracassado golpe da Sé, ficou preso durante seis meses, e fugiu, passando pelas Embaixadas de Cuba e do Brasil, de onde partiria, para juntar-se a Humberto Delgado neste último país. Aí foi iniciada a preparação do golpe de Beja (Janeiro de 1962), onde Manuel Serra foi o chefe civil e Varela Gomes o chefe militar. Golpe que também fracassou. Apesar da fuga levada a cabo, Manuel Serra acabaria preso no Algarve, sendo então submetido à tortura do sono e condenado a 10 anos de prisão, passando bastante tempo encarcerado em Peniche e Caxias.

Depois do 25 de Abril de 1974, Manuel Serra fundou o Movimento Socialista Popular e, em Maio do mesmo ano, integrou-o, como movimento autónomo, no PS. No primeiro Congresso deste partido, contra Soares e Alegre, que se situavam em posições bem mais à direita, Manuel Serra consegue 44% dos votos. Mas, rapidamente, compreendeu (a luta de classes ensina-nos muito) que já nada ali podia fazer face ao aparelho do partido, abandonando então o PS e criando a Frente Socialista Popular.

Seguidamente, e em oposição às políticas dos partidos do capital, envolveu-se com diversas organizações da esquerda revolucionária na construção da resistência ao golpe de direita do 25 de Novembro de 1975, que então estava na forja. Derrotados os trabalhadores e a esquerda pelo golpe reaccionário, Manuel Serra persistiu na luta, apoiando as candidaturas de Otelo à Presidência, em 1976 e 1980. Foi, ainda, em 1980, um dos fundadores da Força de Unidade Popular (FUP) e, posteriormente, seu dirigente.

Apesar das diferenças políticas e de concepção organizativa entre nós, do meu trabalho conjunto com ele ficou-me a ideia positiva de um homem combativo, generoso e solidário.


Comentários dos leitores

Manuel Baptista 14/2/2010, 9:44

Mais um resistente que se apaga. Mas é importante sabermos muito sobre os eventos, os métodos e até sobre as questões teóricas que se punham em determinadas fases da luta. Um questionamento do anti-fascismo e do pós-25 A interessam-me muito especialmente, mas não por saudosismo ou outros motivos, para mim é importante fazer história como o Howard Zinn fazia, com rigor, numa perspectiva anti-capitalista, anti-autoritária.


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