Os colonatos são a essência do sionismo

António Louçã — 13 Dezembro 2008

palestina-nablus.jpgO título deste artigo deve parecer despropositado, no momento em que a polícia israelita, numa operação-relâmpago, invadiu e desocupou o edifício de Hebron que se encontrava ocupado por cerca de duas centenas de colonos.
O edifício, cinicamente baptizado pelos colonos como “Casa da Paz”, era propriedade de um palestiniano que nega tê-lo vendido. Os colonos instalaram-se nele e afirmaram tê-lo comprado. O Supremo Tribunal israelita ordenou a sua evacuação, até que uma instância judicial inferior decidisse sobre o assunto. Os colonos recusaram sair e a questão arrastou-se durante várias semanas.

Aos colonos nunca terá passado pela cabeça que o ministro israelita Ehud Barak decidisse expulsá-los pela força. Toda a experiência anterior lhes ensinava a esperar o contrário. O exército e a polícia protegem-nos sistematicamente, quando arrancam as oliveiras, destroem as colheitas e matam o gado dos palestinianos, quando apedrejam ou incendeiam as casas dos palestinianos, quando agridem crianças a caminho da escola e pacifistas judeus vindos a Hebron em solidariedade com a maioria palestiniana.

Só através dessa sistemática protecção militar-policial se explica que 600 colonos residentes em Hebron possam aterrorizar diariamente uma população palestiniana de 170.000 pessoas. E só assim se explica que muitas vezes os habitantes palestinianos em zonas mais cobiçadas da cidade sejam obrigados a partir e se alegue depois que “venderam” as suas casas.

A política dos sucessivos governos israelitas, com destaque para o próprio Ehud Barak, tinha sido a de encorajarem os colonos a ocuparem cada vez mais território, mesmo nos muitos casos em que depois não conseguem digerir esse território e acabam por deixá-lo ao abandono. A prioridade é expulsar os palestinianos – depois se verá o que fazer com as suas terras. Não admira portanto que os colonos se sintam credores de um apoio incondicional dos governos israelitas, sejam quais forem as atrocidades que lhes ocorra cometerem.

Ainda nesta semana, o presidente Shimon Peres, em visita a Londres, dera uma justificação para a prolongada inacção das autoridades israelitas no que diz respeito à aplicação da ordem de despejo do Supremo Tribunal israelita. Segundo Peres despudoradamente afirmou perante a Câmara dos Comuns, Israel teria muita dificuldade em desmantelar os colonatos “sem causar uma guerra civil”. E quem vai querer uma guerra civil entre israelitas, só para ser cumprido o chamado direito internacional?

Terá a decisão do colonizador Ehud Barak e do demissionário Olmert, ao ordenarem a evacuação do edifício, surpreendido Peres? Não o sabemos. A explicação só pode residir na insegurança que ainda sente o governo israelita após a eleição de Obama. Como ainda está a apalpar o terreno e a ver até onde poderá ir com a nova Administração, o governo israelita quis dar aos colonos uma pequena lição: que só devem colonizar quando são mandados. E que os imperativos da alta política internacional podem por vezes impor alguma contenção à sua voracidade territorial insaciável.

Sendo, assim, a pergunta pertinente não é sobre o motivo que levou Barak a ordenar a evacuação de 200 colonos de Hebron. A verdadeira pergunta é aquela outra, já respondida por Peres na visita a Londres: se a evacuação dos 200 demorou tanto tempo e evidenciou tantas hesitações, como poderá algum dia o sionismo evacuar os colonatos onde ele próprio instalou mais de 200 mil? Não irá nunca evacuá-los, porque esses colonatos são a essência mesma do sionismo e só deixarão de existir quando ele for derrotado.


Envie-nos o seu comentário

O seu email não será divulgado. Todos os campos são necessários.

< Voltar