Para que conste

4 Novembro 2016

O caso, de tão tenebroso que é, fala por tudo o que se possa dizer sobre relações de trabalho.
Em Setembro de 2011, Anderson Delgado, 18 anos, trabalhador da fabrica Dayna, em Alhos Vedros, morreu carbonizado pelo incêndio de produtos inflamáveis que estava a manusear. Apesar dos testemunhos dos colegas da vítima e da Autoridade para as Condições de Trabalho (ACT), o Ministério Público da Moita arquivou o caso um ano depois, por não ver provas de negligência ou violação de normas de segurança por parte do patrão, Licínio Oliveira.

A fábrica, porém, não tinha licença para manusear produtos inflamáveis e o local do acidente era um anexo clandestino. Trabalhadores contaram à ACT que quando se queixavam de falta de segurança ouviam do patrão “Se não estão bem mudem-se, o que não falta são trabalhadores”.
O mesmo patrão tivera já dois outros incêndios com a mesma origem em outras fábricas que detinha na Margem Sul e fora multado mais de uma vez por abandonar produtos tóxicos ao ar livre.

Quando se deu a explosão que matou Anderson, a preocupação do patrão foi fechar as portas do anexo para evitar a propagação do fogo ao resto da fábrica; e quando lhe disseram que Anderson estava lá dentro respondeu “Já está, já está”.

O processo foi reaberto por insistência da mãe da vítima e o tribunal de Almada, em Setembro de 2016, condenou Licínio Oliveira a seis anos de prisão efectiva e a pagar 70 mil euros (e mais 10 mil determinados pelo Tribunal do Trabalho) de indemnização à mãe de Anderson. Licínio, que tinha cadastro criminal limpo, insinuou em tribunal que a culpa teria sido do próprio Anderson que não foi expedito a fugir.

Nos cinco anos decorridos, a ACT não conseguiu encerrar a fábrica, apesar de ter alertado a autarquia, com poderes para o fazer. Em 2015, Licínio fechou a firma e abriu outra no mesmo ramo em nome da filha.
A condenação foi comentada como inédita e inusitada. Talvez por isso, Licínio Oliveira vai recorrer da sentença e continua, assim, em liberdade.


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