A ética alemã e o espírito do capitalismo

António Louçã — 28 Outubro 2015

VWNa melhor tradição weberiana, Merkel e Schäuble têm abundado desde há vários anos em exortações ao trabalho honrado, à frugalidade e à poupança. Essas exortações, dizem ela e ele, são especialmente relevantes para os povos meridionais, levianos e despesistas.
E, como a leviandade e o despesismo não criam riqueza nem enchem a barriga a ninguém, também deve parecer natural que os PIGS (Portugal, Irlanda, Itália, Grécia, Espanha) se tenham tornado um alfobre de vícios morais: corrupção, fraude fiscal, desvio de fundos e um largo etcoetera.
Bem prega Frei Tomás. Nas últimas semanas, assistimos a duas monumentais fraudes, muito alemãs e bem à escala do capitalismo alemão.

Uma foi a do software da Volkswagen, traficado para iludir os limites legais à poluição dos motores a diesel. Outra foi a do Mundial de Futebol de 2006, comprado para a Alemanha, mediante subornos financiados pelo CEO da Adidas, com cumplicidade do líder desportivo Franz Beckenbauer.

Essas duas vêm lembrar-nos muitas outras. Desde logo o escândalo do HypoVereinsbank, que conduziu desde 2005 à tomada, actualmente, daquele instituto pelo UniCredit, com prejuízos para os pequenos accionistas que fazem parecer uma brincadeira de crianças o rol de queixas dos “lesados do papel comercial do BES”.

E há, naturalmente, as fraudes do Deutsche Bank (DB). Uma simples pesquisa combinando “Deutsche Bank” e “Skandal”, leva-nos ao conspícuo site Boerse.ARD.de, onde se encontra um pequeno resumo com cada item desenvolvido:
– manipulação de juros (multa de 725 milhões de euros da Comissão Europeia, reclamação em tribunal de 800 milhões de euros da firma norte-americana “Fannie May”);
– conflito com negociadores de juros antes ao serviço do DB, despedidos por causa da manipulação das taxas Libor e Euribor (DB cede em acordo extra-judicial aos negociadores despedidos);
– manipulação de taxas de câmbio (multa de 3.400 milhões de euros, a partilhar com quatro outros bancos, imposta pelas autoridades reguladoras dos EUA, Reino Unido e Suíça);
– manipulação nos preços do ouro e da prata (as queixas judiciais estão ainda a correr);
– manipulação do valor de hipotecas (prevêem-se queixas judiciais nos EUA);
– cumplicidade na fraude fiscal de vários fundos de investimento (o Senado dos EUA recomenda exigir ao DB devolução de impostos sonegados);
– utilização indevida das plataformas de negociação anónimas conhecidas como “dark pools” (vários reguladores querem investigar a frequência invulgar de utilização destas plataformas pelo DB);
– subavaliação do Postbank, prejudicando os pequenos accionistas deste no acto de compra (o Tribunal Federal da Alemanha obrigou o DB a reabrir as negociações, para determinar que compensação deverá pagar aos accionistas).


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