Todo o apoio ao povo grego!

12 Fevereiro 2015

1.
A vitória do Syriza na Grécia significa uma derrota da política de austeridade levada a cabo pela União Europeia.
Pela primeira vez em toda a Europa, desde que o brutal ataque às classes trabalhadoras foi desencadeado em 2010-2011, as forças partidárias que habitualmente representavam as classes dominantes foram derrotadas e afastadas do governo.

2.
O Syriza apresentou-se às eleições de 25 de Janeiro defendendo o fim da austeridade e a melhoria das condições de vida da população trabalhadora e dos mais pobres; e preconizou o alívio do garrote da dívida pública como passo para o desenvolvimento da economia grega.
Fez frente, deste modo, às imposições com que as potências dominantes da UE estrangulam os países economicamente mais débeis e mais dependentes — como são, além da Grécia, Portugal, a Espanha e a Irlanda. Com isso, pôs também em causa as políticas de ataque ao trabalho que, mesmo nos países economicamente mais fortes, degradam as condições de vida da população assalariada.
Foi precisamente por o Syriza ter prometido lutar pelo fim dessas políticas que a maioria dos eleitores gregos lhe deu a vitória. E é pelas mesmas razões que as populações trabalhadoras de UE olham com atenção e esperança o que se vai passar na Grécia.

3.
Contra todos os que, inclusive trabalhadores, ao longo dos últimos anos têm desvalorizado o papel das lutas de massas, das greves, das greves gerais, dos simples protestos locais — é preciso mostrar que a viragem política verificada agora na Grécia é fruto de todas essas movimentações. É preciso mostrar a todos os trabalhadores que só lutar compensa.
Os gregos sofreram as mais duras das sanções, com efeitos materiais e sociais devastadores, mas não as suportaram nem pacificamente nem com resignação: desde 2010, realizaram dezenas de greves gerais e greves de grande amplitude, sempre acompanhadas de maciços protestos de rua e, muitas vezes, de enfrentamento da violência policial.

4.
Por muito moderado que seja o programa do Syriza à vista das reais necessidades e dos legítimos direitos das classes trabalhadoras, o resultado eleitoral expressa uma deslocação do voto popular para a esquerda que pode abrir um novo rumo às lutas dos trabalhadores na Grécia e na Europa. É este o ponto que interessa agora considerar. Tudo depende do que se seguir.

5.
Não pode haver dúvidas de que as forças imperialistas europeias vão querer matar no ovo a ousadia dos gregos.
Os sinais vieram logo antes das eleições, com todas as pressões que foram exercidas para tentar influenciar os eleitores. E desde então, apesar das cautelas e dos trejeitos diplomáticos, o fundo de todas as declarações não engana: as maiores potências da UE, com a Alemanha à cabeça, querem que a política de austeridade prossiga e que a dívida seja paga até ao último cêntimo. É essa a condição para manterem as classes trabalhadoras e os países mais fracos na sua dependência. Admitirem o contrário seria suicídio, porque facilitaria a propagação da actual rebeldia grega.
Não será, pois, seguramente, a habilidade negocial do governo grego só por si que fará ceder os interesses imperialistas que estrangulam a Grécia. Tudo dependerá da força política posta no confronto. Apenas o medo obrigará os espoliadores representados na Troika a recuar — medo da firmeza da população grega em não se deixar roubar mais, medo que o exemplo de resistência grego se estenda aos trabalhadores dos demais países europeus.

6.
As garantias do novo governo grego de que vai cumprir as promessas eleitorais são a única maneira de o caminho agora iniciado não ter o fim trágico que o poder capitalista de toda a Europa lhe roga.
Acorrer às necessidades dos mais pobres e aplicar medidas de fomento do emprego, permitirá não só assegurar o apoio dos eleitores que confiaram no Syriza como será a única via para alargar a base de apoio do novo governo.
Será esse também o caminho para continuar a enfraquecer a base social dos partidos da direita e para tirar adeptos à extrema-direita, que tem capitalizado apoios e votos com a desgraça das massas populares, nomeadamente espicaçando o ódio aos imigrantes.
Será esse ainda o caminho para que o exemplo dos gregos seja acolhido pelos trabalhadores de outros países da UE como prova de que as políticas de austeridade não são inevitáveis nem são imparáveis.

7.
A viragem verificada na Grécia, a possibilidade de alteração no quadro eleitoral espanhol, o repúdio da população portuguesa pelo governo Coelho-Portas, a instabilidade que se vive na Itália ou em França, sem excluir a receptividade à experiência grega das populações dos demais países da UE vitimadas pela crise do capitalismo, são sinais de que as classes trabalhadoras europeias podem virar a seu favor o balanço de forças com o poder — balanço que lhes é desfavorável e que tem permitido ao capital eternizar as políticas de austeridade e de ataque ao trabalho.
A experiência de cinco anos de austeridade mostra aos trabalhadores europeus que os enormes sacrifícios que lhes são impostos não só são insuportáveis como inúteis. O arrastamento, sem fim à vista, da crise capitalista exige uma mudança de rumo que empurre os custos para cima do capital. A prática mostra que não há ganhos para ambos os lados entre capital e trabalho.

8.
No centro das contradições que se vivem na UE, está o confronto capital-trabalho. A luta de classes entre estes dois campos vai portanto agudizar-se.
Isso mesmo fica evidente na forma como os centros capitalistas da UE unem forças para defender a continuação das políticas de austeridade, dirigidas, como todos sabem, contra a massa dos assalariados.
Por isto, é neste momento ainda mais decisivo que em todos os países europeus se desenvolvam os movimentos contra a austeridade e contra o pagamento da dívida e se declare o pleno apoio ao povo grego na nova situação que enfrenta.
Não será segredo para ninguém que só com um forte apoio interno, assente nos trabalhadores e nos mais pobres, e com um forte apoio externo da parte dos trabalhadores de outros países europeus, poderá o governo grego ter força e autoridade para enfrentar as chantagens e as pressões da UE.
Está nas mãos do governo grego assegurar esse apoio, tudo dependendo da firmeza com que enfrente o imperialismo europeu e defenda os interesses dos trabalhadores gregos. Está nas mãos dos trabalhadores europeus prestar todo o apoio internacionalista que o povo grego merece e de que precisa mais ainda neste momento.

9.
A presente situação na Europa é favorável a um incremento da luta de massas contra a austeridade.
As eleições gregas mostraram, num grau mais terminal que noutros países, a dissolução gradual que vem sofrendo a base de apoio dos partidos que têm exercido o poder.
Contra o que diz a maioria dos comentadores — que focam sobretudo o efeito eleitoral, mas ignoram o fundo do problema — a perda de peso de muitos dos partidos tradicionais do quadro do poder na Europa é um resultado directo da crise do sistema capitalista.
Com efeito, as forças do poder foram durante décadas suportadas pelas classes médias e pelas camadas superiores do proletariado, criadas e mantidas por um capitalismo em crescimento. O fim do crescimento, com a consequente perda de posição social e a incerteza sobre o futuro, leva tais classes a descrer do actual sistema partidário e a procurar saídas à esquerda ou à direita, descalçando os partidos do “centro”.

O arrastamento da crise, que todas as previsões apontam, acentuará este desgaste e abre por isso perspectivas de crises no poder.
Neste sentido, o novo quadro de forças criado pela vontade do povo grego, para além de pôr em causa, aos olhos de todos os povos europeus, o rumo até agora dominante na UE, bem como os agentes partidários que o têm levado a cabo — tem o valor político mais geral de abrir campo a uma luta de ruptura com o capitalismo e o imperialismo.


Comentários dos leitores

João Medeiros 12/2/2015, 18:14

Excelente artigo, companheiros.

João Medeiros 12/2/2015, 18:16

Devíamos divulgá-lo na manif de Domingo

Jose Marques Moreira 12/2/2015, 20:25

A vitoria do Syriza foi e é importante . para todo o povo trabalhador grego . Embora nao sendo a verdadeira mudança o que implica o nao pagamento de todos os juros e mesmo de uma parte da divida que nao foi feita pelos trabalhadores, a saida imediata da CE e NATO o que seria na pratica as medidas de mudança pedidas pelos trabalhadores gregos. Nao deixa o inicio de uma indicaçao de mudança iniciada pelo povo trabalhador grego e que deve ser radicalizada e direcionada por parte da classe operaria e pelos seu partido de vanguarda o KKE. Este deve por um lado apoiar todas as manifestaçaoe e lutas feitas pelos trabalhadores gregos como partido dirigente e revolucionario deve apontar o caminho para a ruptura completa dos interesses das classes trabalhadoreas e principalmente da classe operaria com o sistema burgues e o seu governo social democrata dirigido pelo Syrisa.O KKE deve ter como orientacao a defesa das exigencias feitas pelos trabalhadores gregos e conduzilos no caminho ate à vitoria da revoluçao socialista e do poder operario. Quanto as repercussoes a nivel internacional elas estao à vista os povos de todo o mundo vivem e seguem com muita atençao tudo o que se passa na Grecia e anseiam pela consolidaçao do governo do Syrisa e aprefundamento das medidas pedidas pelos trabalhadores gregos, a manter-se esta ascendente de mudança outros Paises Europeus em particular seguem a mesmo rota de mudança ora à esquerda ou à direita.

jml 15/2/2015, 19:48

SYRIZA, o novo pólo da social-democracia na Grécia!
Entrevista de Elisseos Vagenas, membro do CC do KKE e responsável pela Secção de Relações Internacionais do CC, para o “Jornal de Negócios”, de Portugal 1* .
-Como interpreta os resultados das eleições de domingo?
A mudança de governo, com a coligação entre o SYRIZA e os Gregos Independentes (ANEL), reflete o descontentamento e a raiva do povo contra a ND e o PASOK, partidos que mergulharam o povo na pobreza e no desemprego durante a crise capitalista, bem como na falsa esperança de que o novo governo do SYRIZA poderia seguir uma linha política a favor do povo. O KKE considera que a coligação entre o SYRIZA e o ANEL seguirá o mesmo caminho: a linha do recuo e da transigência, dos compromissos com o grande capital, os monopólios, a UE e a NATO, com todas as implicações negativas para o povo e o nosso país. .
- O que espera de um governo liderado pelo SYRIZA?
Agradaram-lhe as decisões tomadas nestes primeiros dias? Apesar da barulhenta propaganda sobre as negociações com os parceiros-credores europeus e diferenças parciais, o SYRIZA continuará os compromissos antipopulares do país com a UE. Já admitiu que haverá um novo programa acordado com os credores. Mesmo que não se chame memorando, conterá condições contra o povo, como cortes nos serviços sociais públicos universais e gratuitos. As orientações estratégicas do programa do SYRIZA inserem-se no âmbito de servir os interesses dos grupos económicos – a estratégia da UE. O programa SYRIZA, em relação à maioria dos trabalhadores e das famílias populares, vai espalhar a pobreza e o desemprego por ainda mais pessoas.
2 No que respeita às questões de defesa e política externa, o SYRIZA está comprometido com a NATO e a aliança estratégica com os EUA. A posição do governo em relação à questão da Ucrânia, apesar da fanfarronice, durou apenas três dias. No quarto dia, o governo grego alinhou com a UE e votou as mesmas sanções contra a Rússia que o anterior governo da ND-PASOK tinha apoiado (embora as tenha criticado de forma veemente como um partido de oposição), deixando a porta aberta para outras, brevemente. Outro exemplo característico é as declarações do Ministro da Defesa, que anunciaram a continuação da cooperação com Israel...
- O SYRIZA fez uma coligação com o partido Gregos Independentes. Não faria mais sentido uma coligação com o KKE? Por que não aconteceu?
Não, não faria qualquer sentido. Por que o SYRIZA e o KKE estão a seguir caminhos totalmente diferentes. Antes das eleições, o nosso partido considerou que o SYRIZA, caso não tivesse a maioria no parlamento, formaria governo com um dos partidos que, tal como o SYRIZA, são a favor da permanência do país na UE e na NATO; partidos que entendem que o povo tem de pagar uma dívida insuportável, pela qual não tem qualquer responsabilidade, partidos que insistem no caminho de desenvolvimento capitalista. O KKE tem uma posição diferente sobre estas questões fundamentais e luta pelo cancelamento unilateral da dívida, a saída da Grécia da UE e da NATO e a socialização dos meios de produção básicos, com a classe operária e o poder do povo.
- Qual vai ser a posição KKE no Parlamento grego? Está disponível para aprovar medidas apresentadas pelo governo?
O KKE tem como sua tarefa principal fortalecer a oposição militante dos trabalhadores e do povo, dentro e fora do Parlamento, contra os monopólios e o seu poder, contra as alianças imperialistas. Vamos utilizar a força que nos foi dada pelo povo para contribuir para o reagrupamento do mundo do trabalho e o desenvolvimento da aliança social. Temos de fazer pressão, temos de lutar por todas as conquistas possíveis para as camadas populares e por medidas imediatas para aliviar o povo. Entre outras coisas, vamos examinar cuidadosamente todas as propostas de lei, tendo como critério os interesses dos trabalhadores e do povo, e apoiaremos qualquer proposta lei que ofereça verdadeiro alívio aos trabalhadores, o que sempre temos feito. .
O que diferencia o KKE do SYRIZA?
As diferenças são enormes. O SYRIZA é o novo pólo da social-democracia na Grécia e está interessado em gerir o poder da burguesia, com uma “imagem de esquerda”. O KKE é um partido da classe operária, que procura o derrube da barbárie capitalista e a construção de outra sociedade, socialista-comunista.
Deve a Grécia sair da zona euro?
Na nossa avaliação, isso não é suficiente. Sem os outros fatores que descrevemos – como a completa retirada da UE e da NATO, a socialização dos meios de produção e a diferente organização da economia e da sociedade – o retorno à moeda nacional, por si só, pode até levar a piores desenvolvimentos para as camadas populares. .
Por toda a Europa, partidos de esquerda elogiaram a vitória do SYRIZA. Sente que o KKE ainda é o verdadeiro porta-voz dos ideais da esquerda na Grécia?
Há alguns anos, os mesmos partidos celebraram o alegado “novo vento” da eleição de Hollande, na França. Hoje sabemos como isso acabou. Entre outras coisas, o KKE expressa as genuínas tradições militantes do movimento operário e popular no nosso país. O SYRIZA cortou todos os laços com estas tradições. .
O KKE é conhecido pelos seus protestos de rua. Continuarão?
Vamos continuar, com ainda melhor preparação e planeamento, utilizando todas as possibilidades; e contribuiremos para que a linha do contra-ataque seja adotada de forma mais abrangente pelo povo e, também, para o reagrupamento do movimento operário e popular, que é o fator decisivo que irá determinar o resultado da luta. Elisseos Vagenas Membro do CC do KKE e responsável pela Secção de Relações Internacionais do CC

António Alvão 18/2/2015, 23:18

Porque o povo grego acreditou no Syrisa e não no kkE? A revolução socialista, em termos históricos é contraditório com o poder operário. Não devemos confundir o poder operário com o poder do "chefe supremo"!
Abraço.


Envie-nos o seu comentário

O seu email não será divulgado. Todos os campos são necessários.

< Voltar