Quais são afinal os “estados-pária”?

Manuel Raposo — 7 Janeiro 2013

Em final de Novembro passado, a Assembleia Geral da ONU aprovou por esmagadora maioria dos seus 193 estados membros o reconhecimento da Autoridade Palestina como estado observador, o que equivale a reconhecer de facto a existência de um estado palestino soberano. A proposta teve evidentemente a furiosa, mas inútil, oposição dos EUA e de Israel e mereceu da parte do estado sionista represálias contra os palestinos.
A votação da proposta mostrou o isolamento a que estão neste momento remetidos tanto Israel como os EUA. Com efeito, 138 estados votaram a favor, 9 contra e 41 abstiveram-se. Quem foram os do contra? Israel e os EUA, claro, a que se juntaram o Canadá, a República Checa (o único da Europa), o Panamá e quatro pequenos estados do Pacífico (Ilhas Marshall, Nauru, Palau e Micronésia).

Israel que nos dias anteriores à votação tinha vindo a bombardear a opinião pública com a ideia de que a medida era “fútil” e sem efeitos práticos, repetia a ideia estafada de que seria “à mesa das negociações” que a questão israelo-palestina tinha de ser resolvida. Mas este tem sido o argumento de sempre dos israelitas para impedir qualquer resolução do conflito. Entre ataques militares (como o que dias antes contra Gaza matara mais de uma centena de palestinos) e pressões para obter concessões da Autoridade Palestina – Israel pratica uma política de sabotagem de qualquer acordo. Não só a constituição de um estado palestino é rejeitada por Israel, como os territórios árabes são mantidos sob ocupação ilegal, como ainda esses mesmos territórios vão sendo na prática anexados através da implantação de colonatos. Tudo isto, acções condenadas pelas Nações Unidas que Israel sistematicamente desrespeita.

Não admira, portanto, que logo a seguir à resolução da Assembleia Geral os dirigentes israelitas tenham aplicado novas (velhas) represálias contra os palestinos. O governo do fascista Netanyahu aprovou 3 mil novos colonatos em Jerusalém Este e na Cisjordânia e confiscou perto de 100 milhões de euros das receitas dos impostos cobrados à população palestina.
Este sistema de cobrança, de resto, é revelador da prepotência de Israel exercida com a conivência da “comunidade internacional”. São os israelitas que cobram os impostos à população palestina e são eles que entregam os montantes à Autoridade Palestina. Deste modo, como agora se vê mais uma vez, Israel pode sempre estrangular a actividade da Autoridade Palestina, o que significa também os serviços prestados à população.

Esta verdadeira punição provocou reacções negativas de vários países. Os governos do Brasil e da Austrália tomaram a iniciativa de chamar os embaixadores de Israel para condenar as medidas. Outros países da Europa fizeram o mesmo: Espanha, França, Grã Bretanha, Suécia e Dinamarca. Mas do governo português, depois da “ousadia” de ter votado a favor dos palestinos, não se ouviu mais nada acerca das ilegalidades de Israel.

Comentando a votação verificada na Assembleia Geral da ONU e o permanente apoio norte-americano a Israel, o jornalista Glenn Greenwall (The Guardian, 4 Dezembro) fustiga os EUA dizendo que “essencialmente, todo o planeta está de um lado, contra os EUA”. E, lembrando a noção de “estados-pária”, criada no tempo de Bush para justificar a política de agressão militar levada a cabo à revelia do direito internacional, Greenwall acrescenta:

“Se alguém é um membro, em boa posição, da comunidade de política externa liderada pelos EUA, então a maneira como descreve estas questões é a seguinte: ‘a comunidade internacional está do lado de Israel e apoia a sua posição’ – porque, neste mundo deformado e auto-suficiente, ‘comunidade internacional’ é sinónimo de ‘ditame dos Estados Unidos’.
Mas, para aqueles que são suficientemente afortunados para permanecerem fora desse reino de intensa propaganda imperial, a questão é: quem está neste caso realmente contra o consenso da comunidade internacional? Por outras palavras, quem são os verdadeiros ‘estados-pária’?”


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