Praxe criminosa em Famalicão

MATA / MV — 2 Novembro 2009

praxe_mural_72dp.jpgEm 26 de Setembro, o tribunal de Famalicão considerou a direcção da Universidade Lusíada responsável pelos acontecimentos que conduziram à morte de um estudante. O MATA (Movimento Anti-“Tradição Académica”) relata o caso num comunicado de que publicamos as principais passagens.

Em Outubro de 2001, Diogo Macedo, estudante de arquitectura e membro da tuna académica, morreu devido a lesões cérebro-medulares, após acontecimentos ainda por esclarecer ocorridos na noite em que, aparentemente, tinha decidido abandonar a tuna por não suportar mais as praxes a que era submetido.

Inicialmente, a morte foi considerada acidental, mas a autópsia revelou múltiplas escoriações corporais, além da fractura de uma vértebra cervical resultante de agressão e que teria sido a causa da morte.

Dois elementos da tuna chegaram a ser constituídos arguidos. Contudo, o processo foi arquivado em 2004 por falta de provas. Com efeito, apesar de estarem perto de 20 pessoas nas mesmas instalações que Diogo, nenhuma delas se recordava dos acontecimentos. Após a morte, ter-se-ão reunido de urgência para gizar versões sobre os factos, oportunamente gerando uma “amnésia” colectiva que se apoderou dos “amigos” e “colegas” de Diogo, impedindo-os de fornecerem qualquer pormenor. O próprio juiz reconheceu o “muro de silêncio” que tinha sido criado.

Depois do processo-crime, seguiu-se o processo cível. O tribunal deu como provada a morte do estudante em consequência de uma pancada, desferida durante a praxe, obrigando a Universidade Lusíada de Famalicão a pagar uma indemnização de 90 mil euros à família de Diogo por considerar que a ULF não controlou nem evitou as praxes académicas. Esta decisão é idêntica à de outros tribunais relativamente a casos semelhantes, no sentido de responsabilizar as faculdades pelos actos que se passam durante as praxes.

Sobre o caso, o MATA faz algumas considerações pertinentes.

Estranha que apenas 3 anos depois da morte de Diogo Macedo os acontecimentos tenham sido tornados públicos, em grande parte devido a uma reportagem da jornalista Felícia Cabrita, apesar de a direcção da Lusíada ter ameaçado de expulsão qualquer aluno que lhe prestasse declarações.

Acusa a Universidade de impedir que a mãe de Diogo tentasse descobrir as causas da morte do seu filho e de silenciar as vozes que poderiam esclarecer as circunstâncias em que o aluno morreu.

Nesta tuna (e em todas as outras tunas universitárias), a democracia é inexistente. O relacionamento é totalmente condicionado por uma hierarquia absolutamente rígida. Quem as integra obedece a uma autêntica estrutura de castas com claro prejuízo para quem está “mais abaixo” na cadeia. Este era o caso do Diogo, que apesar de já a integrar há 4 anos, continuava a ser “caloiro” e alvo de animosidade, a qual esteve na origem da sua decisão de abandonar o grupo.

À semelhança do que se passa noutras instituições do ensino superior, é evidente a conivência entre direcções e grupos de estudantes que têm como base a hierarquização, submissão e proliferação de comportamentos repressores e violentos. Não se pode perpetuar estas “tradições” imaginárias que se apoderaram do vazio cultural e intelectual que tem caracterizado as escolas nestes últimos anos.

Este caso extravasa os contornos praxísticos, a sua gravidade é a de um homicídio. Homicídio que ocorreu no contexto da praxe, numa tuna, entre estudantes, nas instalações de uma faculdade do ensino superior. Estes factos obrigam-nos a pensar na arbitrariedade da “tradição”. A “tradição” não pode cobrir de impunidade actos como este, os muros têm de ser derrubados e permitir que a verdade venha ao de cima.

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