As falsas escolhas do costume

José Mário Branco — 27 Junho 2008

zimbabwe72dpireduz.jpgO circo internacional, ONU incluída, em torno das eleições presidenciais no Zimbabwe é mais um momento esclarecedor da hipocrisia e do desplante das grandes potências, dos dois pesos-duas medidas que sistematicamente aplica na política internacional conforme os seus interesses de domínio.

A técnica é sempre a mesma: colocar-nos perante o dilema de, para criticar o imperialismo, arriscarmos o ferrete de estarmos a defender algum ditador indefensável. Como na guerra fria nos queriam entalar, sistematicamente, entre o horror do imperialismo ocidental e o horror do social-imperialismo da URSS. Como, há cinco anos e meio, nos quiseram obrigar a ser amigos do Saddam só porque éramos contra o crime anunciado da invasão do Iraque.

O problema é que esses democratas escolhem os ditadores a dedo e conforme os dias. Não são contra os ditadores, mas contra certos ditadores, em certos momentos. Quando lhes convém, elegem um alvo preferencial que, imediatamente, ocupa os títulos, os telejornais e os comentários com o óbvio aspecto de campanha organizada.

Nem uma palavra sobre as piores ditaduras apoiadas pelos governos ocidentais, à cabeça de todas o Egipto, mas também a Tunísia, a Nigéria, o Turcomenistão, a Guiné Equatorial, a Arábia Saudita e o “libertado” Kowait, etc. Nem uma palavra sobre a ditadura global da CIA/EUA, que rapta, prende e tortura quem lhe apetece e se furta ostensivamente a qualquer escrutínio judicial internacional. Nem uma palavra sobre a ditadura exercida com incrível violência pelo Estado sionista de Israel sobre os seus próprios cidadãos de origem árabe e sobre Gaza. Etc.

Dois pesos, duas medidas. É gente sem princípios nem moral que, em nome da realpolitik, desencadeia estas operações de pura propaganda, com a carrancuda ou jovial prestação dos sargentos do pequeno ecrã e do comentário.

A democracia desta gente – aquela em que vivemos – é falsa, como são estas escolhas que nos propõem.


Comentários dos leitores

António Alvão 2/7/2008, 15:12

Olá Zé Mário:
Então querias que a direita capitalista, imperialista, criticasse os ditadores de quem gosta? A esquerda, ou alguma esquerda, também não o faz! Não devemos ter medo que a direita nos avalie pelas nossas posições. Em vez de andarmos a ver quem gosta mais deste ou daquele ditador, desta ou daquela invasão, desta ou daquela violação dos direitos humanos, deveríamos ocupar este tempo em combater toda essa direita capitalista na prática. Sempre houve ditadores para todos os gostos.
Um abraço.


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